Porque sei que é amor: 1ª temporada

PRIMEIRA TEMPORADA DO PRIMEIRO CONTO DA AUTORA

Porque sei que é amor



Capitulo 1: O sofrimento nos ensina, nos molda, nos motiva e nos machuca


Por mais que saibamos que a vida é carregada de chegadas e partidas como diria a canção, ninguém está suficientemente preparado para tragédias.

Não foi diferente comigo, quando na adolescência, perdi tragicamente meus pais num tolo acidente automobilístico.

Assim minha vida teve o chamado divisor de águas, a perda precoce de meus pais forçou-me a adotar uma postura madura também precocemente, a fim de dar suporte a minha irmã caçula tão dependente dos meus pais, além de gerar em mim um medo inexplicável de apegar-me as pessoas.

Desde o trágico acidente que vitimou papai e mamãe, o papel de irmã mais velha protetora, exemplo de força, arrimo para minha doce irmã Lívia tornou-se minha prioridade, mesmo contando com todo apoio de meus tios e tias além de nossos avós, eu me sentia a maior responsável por Lívia, apesar de nossa diferença de idade não ser tão grande, eram apenas cinco anos.

Após a morte de nossos pais, passamos a morar com uma tia, que apesar de jovem, era viúva, sem filhos, sempre nos tratou como filhas.Apesar de sempre aparentar um excelente humor, com ares de mulher bem resolvida com uma vida financeira bastante confortável, e exemplarmente elegante, aquela mulher carregava muita frustração e solidão por ter ficado viúva com apenas 2 anos de casamento sem sucesso nas tentativas de engravidar. A nossa presença em sua espaçosa casa sem dúvida mudaria a vida dela também.

Ela nos apoiava em tudo, e administrava a herança de nossos pais, fazendo questão de me comunicar tudo que faria e como eu deveria me portar em relação às nossas reservas financeiras.

Como advogada bem sucedida, com seu próprio escritório, o qual era o de melhor reputação entre as maiores empresas da região, ela não escondia o desejo que eu prestasse vestibular para direito, para assim trabalhar com ela e continuar seu legado. Como se aproximava a minha escolha, volta e meia ela deixava isso evidente, me trazendo livros e me levando para o escritório algumas vezes após as minhas aulas.

Para a decepção de minha querida tia, em nada me atraía aquele universo de leis. Desde criança, meus pais foram a referência máxima do que eu queria pro meu futuro, parece clichê, mas depois da morte deles, eu tinha a certeza mais que absoluta que seguiria seus passos na carreira.

Meu pai era um renomado cardiologista, pouco antes do acidente, fora nomeado chefe do serviço de cardiologia do hospital universitário. Mamãe, também médica, entretanto mais dedicada a docência, estava concluindo seu mestrado em neurociências quando nos deixou... Definitivamente, era essa carreira que eu queria seguir.

Quando enfim tive coragem de comunicar isso a tia Sílvia, apesar de decepcionada, admirou-se da minha firmeza e objetividade, e apoiou-me completamente. No final do ano de 1993, prestei vestibular em 4 universidades em diferentes cidades, tia Sílvia me acompanhou em todas as provas.

Foi um ano difícil, eu estudava dia e noite, sobrando-me pouco tempo para os apelos da adolescência, eu tinha poucos amigos, nenhum muito especial, considerando que minha suposta maturidade me afastava de relações mais profundas, as únicas pessoas que me enxergavam como eu era de fato, eram minha tia Sílvia e minha irmã caçula, que apesar de minha super proteção, também se revelava uma criança precoce no entendimento das coisas, o sofrimento às vezes provoca isso nas pessoas.

Para a satisfação de minha família, passei em duas das universidades que prestei vestibular, uma delas na cidade mesmo, a mesma que mamãe fora professora. O período da universidade não fora muito diferente dos que antecederam o vestibular, estudava em domingos, feriados, saía de casa às 7 da manhã, retornando somente as 22h. Aproveitava o intervalo entre as aulas para pesquisar na biblioteca, sempre objetivando ingressar em projetos de pesquisa, assim como meus pais fizeram na sua graduação.

Era pra mim como uma missão, e me comprometi completamente nela, ignorava as farras tão própria dos universitários, e como se repetiam essas farras nesse meu universo... Todos os meses alguma sala promovia algum churrasco, alguma festa, calourada... Até me rendi em algumas ocasiões por insistência de algumas colegas, conheci alguns rapazes, mas nenhum que despertasse em mim paixões, ou que me fizesse querer relacionamentos sérios.

Na universidade conheci uma das minhas poucas amigas verdadeiras: Olívia. Ela odiava seu nome, então sempre a chamávamos de Lili. Sem dúvida uma das pessoas mais persuasivas que já conheci na vida! A Lili era uma jovem muito bonita, tinha cabelos extremamente lisos, meio chanel, era magra, mas com curvas típicas de brasileira, era dona de um belo par de olhos claros, ela mesma não sabia definir a cor, num tom jocoso repetia sempre que seus olhos eram ”furta-cor”, geralmente essa observação era seu assunto preferido no jogo da sedução que ela praticava com tanta freqüência, especialmente com os alunos do internato que marcavam ponto todos os finais de semana no “Estetos”.

O Estetos era um bar localizado próximo ao campus da saúde, o peculiar nome era uma abreviação de estetoscópio (aparelho de asculta pulmonar e cardíaca), obviamente esse nome se dava por sua clientela, predominantemente composta por acadêmicos de medicina, enfermagem, fisioterapia... Famosos pela, digamos, sua afinidade com bebidas alcoólicas.

Às vezes que estive no bar, o fiz por insistência da Lili, que sempre conseguia de mim o que queria, aliado ao talento pro humor impecável de outro amigo em comum, o Bernardo, os dois foram os responsáveis pelos poucos momentos festivos da minha fase universitária.

Bernardo estava adiantado em relação a nós em algumas disciplinas, perdeu duas disciplinas básicas e foi aí que nos conhecemos. Nossa afinidade era incrível, nos auto denominávamos de “santíssima trindade”. Apesar de não sairmos muito, estávamos sempre juntos na universidade, estudávamos juntos para as provas, éramos cobaias um pro outro nas práticas... Não conto as vezes que saíamos cobertos de esparadrapos cobrindo os muito hematomas nos braços nas nossas tentativas em puncionar as veias um do outro... Isso sempre era motivo de risos e piadas entre os colegas.

Mas em se tratando de piadas, ninguém dominava isso melhor do que o Bernardo, assim, facilmente ele virava o centro das atenções. Era muito querido pela maioria, exceto por alguns machistas que irritavam profundamente a mim e a Lili quando chamavam o Bernardo de boiola.

O Bernardo não demonstava irritação, aprendera a driblar esse tipo de tratamento, e estava muito bem resolvido na sua sexualidade, desde cedo saíra da casa dos pais para não ter que prestar satisfações da sua orientação sexual, sua segurança em relação a isso nos orgulhava, mas como amigas dele nos doía muito esses rótulos.

Os seis anos de faculdade, transcorreram sem grandes acontecimentos, exceto um fato que tantos jovens costumam destinar atenção: e perda da virgindade, para mim se deu de maneira casual, sem a magia romântica, aconteceu pelo apelo circunstancial do corpo, mas que não teve repercussões na minha vida sentimental. O namoro mais duradouro que tive não passou de dois meses, por mais que eu tentasse, não me sentia a vontade com os homens exceto com o Bernardo, mas isso ele mesmo dizia:

- Mona, eu não valho na sua contagem, porque da fruta que você gosta chupo até o caroço...

- Que ditadozinho infame, Bê! – eu retrucava fazendo careta pra ele...

- Amiga, você sabe que sou uma mulher disfarçada de homem, porque os melhores homens gostam desse disfarce aqui...Entonces mi preciosa... – no seu peculiar tom jocoso ele respondia aparentando desdém...

Concluímos a nossa graduação em novembro de 2000, eu estava com 23 anos, cada um de nós tinha planos diferentes para o futuro, eu me perdia entre o desejo de seguir na pesquisa, fazendo mestrado e me dedicando a pesquisa e a docência como mamãe, ou fazer residência em neurologia. Lili estava decidida a fazer residência em oncologia, as experiências familiares com câncer a afetaram profundamente, isso motivou essa escolha, Bernardo era viciado em adrenalina, seus estágios extracurriculares sempre eram em urgências, e assim já tinha decidido por essa área.

Pra nossa tristeza, os melhores programas de residência em cada área escolhida eram em diferentes cidades, assim, a santíssima trindade inevitavelmente teria que ser separada. Optei pela residência, adiando meus planos de mestrado para um outro momento, mas não desisti da pesquisa, sendo aprovada no começo de 2001 na residência da UFRJ. Lili foi aprovada e mudou-se para São Paulo, Bernardo na segunda tentativa passou e mudou-se Campinas, passou seis meses trabalhando como plantonista e estudando para a prova de residência.


CAPÍTULO 2 : UMA NOVA CIDADE, UMA NOVA VIDA

Era, enfim, o início de um novo ciclo. Nunca saí da proteção da minha família que, de tão acolhedora, por vezes sufocava com tanta proteção. Nada mais natural, dadas as circunstâncias que tornaram minha adolescência uma sucessiva história de perdas e recomeços. Se esse período já consiste em uma fase de luto pela perda da infância, indecisão quanto ao seu papel na sociedade e todos os conflitos de idéias e das mudanças inevitáveis, imagina então o que é enfrentar perder os pais abruptamente nessa fase...

Mas enfim, eu não era mais uma adolescente, atravessara essa fase com algumas marcas, mas alcancei os objetivos que até então eu traçara pra minha vida. Sentia por ter me ausentado por muito tempo da vida de minha querida Lívia, que se transformara em uma jovem linda, centrada e que seguia os passos de tia Sílvia, fazendo faculdade de Direito.

Ao contrário de mim, era cercada de amigos e dividia muito bem o tempo de estudo com saídas pra baladas. Mantinha um namoro de um ano com Afonso, jovem estagiário de informática do escritório de tia Sílvia. Mesmo com limitações, Lívia e eu zelávamos pela nossa relação de confiança, proteção, tínhamos pouco tempo juntas, mas sempre fomos honestas em tudo o que me dava a sensação de ter cumprido bem meu papel de irmã mais velha.

O dia da minha mudança para o Rio de Janeiro se aproximava. Tia Sílvia, como sempre, fez questão de me acompanhar em tudo. Tão logo recebemos o resultado da minha aprovação na prova, viajou comigo ao Rio para alugar apartamento e acertar detalhes da mudança. Como qualquer mãe preocupada, Tia Sílvia estava apavorada por eu sair da segurança de uma pequena cidade universitária de Minas, para uma cidade violenta como o Rio de Janeiro. Apreensiva ela tratou de me presentear com um carro, temendo minha disposição em andar de ônibus.

Alugamos um apartamento de dois quartos na Ilha do Governador, de carro não gastaria mais de quinze minutos para chegar ao Fundão – onde ficava o hospital universitário. Era um apartamento razoável, não tinha o espaço e o conforto da casa de Tia Sílvia, mas para morar sozinha, tinha espaço mais que suficiente: uma sala de estar espaçosa com saída pra uma varanda, conjugada com a sala de jantar dividida por um balcão que dava acesso a cozinha e a área de serviço. Mais a frente das salas conjugadas, um corredor com um banheiro social, um quarto, e ao final uma suíte que seria meu quarto.

Gastamos uma semana para comprar tudo, Lívia veio nos ajudar, ela sempre teve um excelente gosto pra decoração, puxou isso da mãe, tio Roberto sempre dizia. Mobiliamos o segundo quarto com uma estante de livros, uma escrivaninha para ser minha pequena biblioteca e um sofá cama, na intenção de abrigar hóspedes quando necessário. Em cada cantinho do apartamento tia Sílvia e Lívia deixaram sua impressão, nos detalhes dos abajures, quadros, louça, roupas de cama... Tudo pra me deixar mais “perto de casa”, apesar de que mesmo com todo carinho maternal que eu tinha na casa de tia Sílvia, a última vez que me senti de fato em casa, foi na chácara onde morávamos antes da morte de papai e mamãe.

Era março de 2001 e, como dizem, o ano no Brasil só começa depois do carnaval... Em uma cidade como o Rio, essa afirmação caía muito bem. Sempre preocupada com minha saúde, como não podia ser diferente, já que desde criança, apresentava constantes crises de asma, tia Sílvia, providenciou alguém para fazer faxina e cozinhar pra mim. A senhora fora indicada por um casal de advogados amigos, que moravam no Rio há alguns anos. Dona Lúcia era uma senhora de seus quarenta e poucos anos, muito simpática, era baixa, morena, com peso avantajado, com traços fortes, visivelmente marcados pelo sofrimento de uma vida cheia de sacrifícios.

Cheguei ao apartamento no sábado, queria me acostumar com o bairro, com o clima, o caminho até o Fundão. Minha intenção era até a segunda-feira estar ambientada no meu novo espaço, mas foi inútil, porque demorei cerca de um mês pra acertar o caminho sozinha. Saía de casa quase uma hora antes para não correr o risco de chegar atrasada, porque sempre pegava uma rua errada. Após enfim aprender o caminho, ria do quão absurdo era isso, pois se tratava de um percurso bastante simples

No programa da residência, contava com quatro colegas, e facilmente desenvolvemos um clima amigável, somente um era carioca, os demais, como eu, eram provenientes de outros estados.
Eramos três homens e duas mulheres na residência: Jessica, era descendente de chineses, porte elegante, tímida, mas bastante educada, era fácil gostar dela, tinha um olhar meigo, acolhedor, quando permitia que víssemos esse olhar; Carlos era um negro com um corpo escultural percebia-se isso pelas roupas justas que ele fazia questão de exibir, com um sotaque baiano gostoso, extremamente simpático; Eduardo o carioca da turma, um rato de praia, tinha pele visivelmente bronzeada, e cabelos queimados pelo sol, preferia ser chamado de Dudu por nós, o que era motivo de repreensão dos preceptores que faziam questão que nos tratássemos com o “doutor” na frente... pra nós isso era estranho, mas atendíamos a orientação dos preceptores, o que não evitava de escorregarmos vez por outra... E por fim Marcos, sujeito estranho a primeira vista, sisudo, mas no fundo era muito desajeitado nas palavras e nos gestos, brincávamos com ele pra que ele andasse com os braços juntos do corpo pra não causar nenhum acidente nos corredores do hospital... Tinha olhos verdes doces, disfarçados por óculos que lhes dava um aparência de “nerd”.

A residência era exaustiva, trabalhávamos até quatorze horas por dia, às vezes mais, tudo era avaliado pelos preceptores. A pouca quantidade de médicos nos obrigava vez por outra atender no pronto socorro, as vezes em casos que não eram específicos de neurologia. Em uma dessas vezes, eu e Dudu fomos encaminhados para ajudar no atendimento de vítimas de um acidente com uma van ocorrido na linha vermelha.

O pronto socorro estava uma loucura, o acidente envolvera mais de um veículo, como o Fundão era o hospital mais próximo os casos foram todos encaminhados para lá, dezenas de pessoas feridas, alguns inconscientes, a frenética correria das equipes de enfermagem, a gritaria dava aquele cenário o aspecto de um seriado americano...eu olhava pro Dudu meio perdida:

- Por onde a gente começa Du?

- Caraca Belinha... Eu ia te perguntar a mesma coisa... – Dudu respondeu com aparência de pavor.

Enquanto nós estávamos perdidos olhando aquela cena, o Dr. Jorge Porto, um dos nossos preceptores, nos surpreendeu falando alto:

- Dra Isabela, Dr Eduardo, vocês foram chamados para assistir não para assistir entenderam?

Pelo tom da voz notamos que se tratava de uma chamada de atenção, mas ficamos tão confusos quanto o cenário a cerca de qual o sentido de cada verbo assistir que deveríamos praticar... Dudu olhou pra mim com cara de interrogação cochichando:

-A gente assiste prestando assistência, ou a gente fica parado vendo, assistindo?

Eu não consegui responder nada só ri, até mesmo porque não daria tempo... A cara de reprovação do Dr Jorge pra nossa inércia respondeu nossa dúvida... Fomos em direção a uma ambulância que chegava, desembarcou junto com uma paciente na maca, uma mulher, com as roupas cobertas de sangue, ela pressionava um ferimento no tórax da paciente, gritando informações sobre os sinais vitais da paciente de quanrenta e seis anos, chamando atenção para a escala de coma que a paciente se encontrava, provavelmente por conseqüência de traumatismo craniano.

Em meio àquela confusão de vozes, aquele tumulto de pessoas correndo, aquela mulher, apesar de estar coberta de sangue, suada, cabelos despenteados, chamou-me a atenção de uma maneira insana!

Eu não entendi por que não conseguia tirar os olhos dela, por alguns segundos houve um silêncio e os movimentos dela se desenhavam como se fossem em câmera lenta, com meus olhos fixos nela, apesar de toda aquela confusão que o cenário fazia dela, me detive nos seus traços, nas suas expressões, e desci meus olhos pelo corpo dela, enquanto ela saía de cima da maca, retirando o casaco sujo, deixando visível seu colo perfeito e sua cintura ajustada por baixo daquela blusa colada ao seu corpo definidos com um jeans apertado... Se Bernardo visse aquela calça logo comentaria: “querida, Deus é justo, mas essa calça...”

Saí daquele momento de êxtase com o Dudu sacudindo meu braço dizendo:

-Belinhaaaaaa, alouuuu, onde você tá? Vamos lá avaliar a paciente antes o Jorge sugue nosso cérebro pelos olhos dele...

-Hã? Ah... Tah... Claro... Vamos sim... -ainda recuperando meu fôlego da imagem daquela mulher.

Mas quem seria aquela mulher? Seria parente da vítima? Estava ela também envolvida no acidente? Estaria machucada? Aquele sangue era seu? Mas ela dominava termos técnicos e procedimentos... Deveria ser do meio da saúde... Em meio a tantos questionamentos, segui o Dudu até o ambulatório e ficamos ali atendendo a paciente em questão.

Enquanto esperávamos os resultados dos exames realizados, a porta da sala de tomografia foi aberta e uma linda mulher adentrou de cabelos presos, usando um jaleco e imediatamente lembrei de quem se tratava... Era ela! Ela andou até nós de maneira confiante, olhando nossos crachás, ela nos indagou:

- Vocês estão acompanhando o caso da Sra. Fátima da Silva?

- Sim e você quem é? – cheio de graça o Dudu se apressou em responder, olhando aquela mulher da cabeça aos pés...

- Dra. Suzana Andrade, nova chefe da emergência – com ar de superioridade a bela morena respondeu olhando o prontuário que trazia nas mãos.

Eu não consegui balbuciar uma palavra olhando completamente hipnotizada para aquela imagem. Dra. Suzana Andrade era alta, os cabelos chegavam nos ombros, eram lisos, mas as pontas tinham algumas ondulações, tinha olhos amendoados, uma boca muito bem desenhada, que ficava evidente enquanto ela mordia os lábios, lendo com atenção as informações por nós colhidas no prontuário da paciente. Imaginei que tivesse mais de trinta anos, pelo fato de já ser chefe de um hospital daquele porte, mas não aparentava mais de vinte e oito anos... Não entendia minha reação diante dela, até aquele momento nenhuma mulher despertou tal atenção, era mais que atenção, era encantamento...



CAPITULO 3 : NOVAS SENSAÇ’ES


Enquanto o meu mais novo alvo de encantamento nos explicava a extensão das lesões da paciente e nos indagava como um de nossos preceptores a cerca do tratamento adequado, eu me aproximava dela pra ver o que ela mostrava nas imagens da tomografia. Não pude evitar de sentir seu perfume, não era doce, era quase amadeirado, quando ela girava o pescoço em direção a nós eu paralisava, não conseguia absorver uma só palavra que ela tão concentrada nos dirigia. Foi então que me encarando ela perguntou:

- Você concorda com seu colega Drª ..

-Isabella Bitencourt – completei. – Desculpe-me Dra, mas concordo com o que mesmo? – acabei confessando minha distração com tal pergunta.

Dudu não entendia o que se passava comigo, uma vez que não havia uma pergunta feita pelos preceptores que eu não saísse na frente com mil respostas e hipóteses...

-Belinha, qualé, você ta bem? - cochichou sem graça.

-Ah desculpe-me estou meio atordoada ainda... Mas, Dra Suzana pode repetir a pergunta por favor?

- Perguntei qual seria a conduta para o edema cerebral da paciente- a linda médica falou olhando-me séria. – Seu colega sugeriu aliviar a pressão intracraniana cirurgicamente, você concorda?

- Não - voltei a meu estado racional costumeiro e concluí: - As imagens e a clínica da paciente não evidenciam PIC (pressão intracraniana) aumentada que justifiquem um procedimento invasivo tão arriscado, o edema pode ser monitorado através da administração de corticosteróides nas próximas vinte e quatro horas.

Ela me fitou admirada com a segurança da minha resposta, sorriu com o canto da boca e disse:

- Muito bem, Drª Isabella, você vai se encarregar de monitorá-la e me manter informada, ela acabou de sair do centro cirúrgico, a hemorragia do tórax foi contida, nos resta controlar o edema cerebral – falou com a segurança que estava me encantando ainda mais.

Saiu da sala, mas antes de fechar a porta, girou seu rosto pra trás, e me encarou por alguns segundos, o suficiente pra deixarem minhas pernas bambas, em seguida bateu a porta. Dudu, me cutucou com a ponta dos dedos dizendo:

- Que ‘mulé’ é essa! Que olhos, q boca... E ainda é chefe? Ai virou meu sonho de consumo! Já sei quem vai animar essa residência... Nem que seja nas minhas fantasias...

Mal sabia o Dudu que ele estava exteriorizando meu pensamento... Mas me contive, dei-lhe um tapa nas costas e saí da sala em direção a UTI onde a Srª Fatima da Silva se recuperava da cirurgia. Segui à risca o pedido, ordem, orientação, seja lá o que fosse da Drª Suzana Andrade, e passei as vinte e quatro horas monitorando a evolução do edema cerebral da paciente.

Na verdade não saí da UTI, exceto pra lanchar alguma coisa, não gastando mais de 20 minutos. O quadro da Srª Fatima evoluía bem, inclusive com a redução do edema cerebral, no fim das 24 horas mostrava sinais de saída do estado de coma.


Eu escrevia as prescrições no prontuário, me preparando pra deixar meu plantão, quando senti uma presença se aproximando atrás de mim no balcão da UTI, e me virei como no impulso, Drª Suzana sorriu assustada, me abordando:

- Não está na sua hora Drª?

Retribuindo o sorriso, respondi:

- Provavelmente minha hora já passou há umas doze horas... Mmas não podia deixar de atender sua ordem de monitorar a paciente.

Mas que loucura era essa? Eu estava me derretendo pra uma mulher? E tire esse sorriso bobo da cara Isabella Bitencourt! O que ela vai pensar de você? Mas o que importa o que ela pensa de você? ‘Alou’ Isabella se situa!

Enquanto eu surtava diante da imagem estonteante de Dra Suzana, ela me interrompeu os pensamentos, me interrogando sobre a evolução da Sra Fatima. Respondi tudo atentando pra cada detalhe numa tentativa ridícula de impressioná-la... Ela ouvia atentamente, ao final, tocou meu ombro, o que despertou em mim um arrepio de excitação em todo meu corpo. Ela disse:

-Drª Isabella, a paciente não poderia ter melhor tratamento, ou melhor médica pra acompanhá-la, estou impressionada, você será uma grande neurologista...

Eu ainda estava me recuperando da excitação, olhando embevecida pra os olhos daquela mulher incrível, quando fui tomada por um novo arrepio acompanhado de um frio na barriga que parecia se espalhar, causando um tremor, no momento q ela suavemente tocou nos meus braços enquanto passava as pastas sob o balcão.

Perdi completamente a compostura e derrubei os papéis que escrevia sobre o balcão. Notando o meu nervosismo, Dra Suzana apressou-se em abaixar-se pra ajudar-me a recolher tudo, enquanto fazia isso, foi inevitável que nossas mãos se tocassem acidentalmente, dessa vez não pude deixar de perceber que sua pele também se ouriçava, por alguns segundos nos olhamos, até que a enfermeira de plantão entrou pegando os papéis de nossas mãos, nos ajudando a organizar tudo no balcão.

Rapidamente me recompus, e pedi licença pra me trocar e em seguida voltar pra casa, confessando meu cansaço. Com um gesto de concordância ela me acompanhou enquanto eu me dirigia a sala de repouso médico, e com um ar tímido, discrepante da até então postura auto-confiante dela, ela parou à porta do repouso perguntando:

- Você já comeu alguma coisa hoje?

-Tenho que confessar que não sei se comi hoje ou ontem, dentro dessa UTI é difícil distinguir dia e noite... – respondi sorrindo.

- Gostaria de me acompanhar em um café aqui mesmo na cantina? – convido-me num tom de voz mais baixo.

Não tinha como recusar o convite, descemos pelo elevador sem trocar uma palavra, me flagrei observando-a numa expressão de gula... Desconhecia completamente aquela sensação, tinha medo do que sentia, mas ao mesmo tempo ignorava meu cansaço, meus receios, só me bastava estar ali diante dela.

Caminhamos em direção à cantina, e fomos interrompidas algumas vezes por funcionários que traziam papéis pra que ela assinasse, desculpava-se como se isso me ofendesse. Sentamos numa mesa do canto, que ficava de frente pra o jardim do pátio, enquanto tomávamos o café.

Percebia que algumas pessoas nos olhavam, inclusive o Dudu e o Carlos. Lembrei-me imediatamente dos comentários do Dudu, sobre fantasiar com Suzana, e senti um ciúme irracional. Ela passeava a ponta dos dedos nas bordas da xícara, buscando algum assunto pra interromper nosso silêncio intimidador, até que lhe indaguei:

- Você me parece bastante jovem para assumir um cargo de tanta responsabilidade, deve ser uma profissional prodígio...

- Prodígio? - sorriu relaxada. – E´um bom adjetivo doutora... E vou tomar como elogio o jovem, mas não sou nada prodígio, sou metida... Por isso me meti a ser chefe – continuou rindo. - Recebi a proposta depois de um ano como atendente, concluí aqui minha residência, e sempre tive boas referências dos meus superiores, e aceitei o desafio, mas confesso que estou apavorada com a responsabilidade.

Continuei interessada no que ela ia me revelando, e aos poucos ia me abrindo sobre minha história, fato raro com pessoas desconhecidas, diria até fato inédito. Quando nos demos conta, estávamos conversando há mais de uma hora, e seu celular não parava de tocar, quando me senti forçada a encerrar nosso papo deixando-a livre para seus compromissos. Mas a verdade é que eu não queria sair da sua companhia, e o desejo me parecia recíproco... Até que num ímpeto ao me levantar da mesa, perguntei-lhe:

- Você é daqui não é?

-Sim, por quê? - respondeu curiosa.

- E´que... Bem... Estou morando aqui a quase quatro meses mas ainda não conheço nada da cidade, nem sequer o pão-de-açúcar... E você sabe que... Residente não tem muito tempo pra conhecer gente... E terei folga amanhã...

- Você acabou de ganhar uma autêntica guia carioca! Felizmente também estarei de folga, faço questão de te mostrar essa cidade linda!

Não podia acreditar que acabara de forçar um convite pra sair com a Dra Suzana Andrade... O que estava acontecendo comigo afinal? Nunca me considerei uma homofóbica, a convivência com Bernardo me fez ter horror a esses tipos de rótulos, entretanto nunca considerei a possibilidade de ficar com mulheres, pra mim isso fazia parte de outro mundo.

A satisfação que eu sentia me imaginando um dia inteiro na companhia dela transpunha qualquer preconceito, aquele sentimento era novo mas eu ansiava por vivê-lo.

A volta pra casa foi tomada por pensamentos que centralizavam a voz de Suzana, o som de seu riso, seu perfume, não pensava em nada mais que não fosse nosso encontro no dia seguinte, ansiosa eu imaginava o que deveria vestir, fazia combinações de roupas na minha mente, supondo o que mais a agradaria...

Era patético meu comportamento, mas eu não conseguia fugir daquilo. Toda aquela ansiedade atrapalhou meu descanso, não vi a hora de me reencontrar com Suzana, marcamos para as 10h daquele sábado, ela fez questão de ir me pegar em casa, dei-lhe meu endereço e as 8 da manhã eu já estava de pé provando várias peças do meu guarda-roupa sem conseguir me decidir por uma só.

O dia não podia ser mais perfeito, não chovia, o sol estava ameno, não teria problemas para escolher uma roupa confortável, mas eu queria mais, queria chamar atenção de Suzana, apesar de não entender ainda o que sentia por ela, nem muito menos o que ela esperava de mim...

Acabei optando por uma calça corsário branca, com grandes bolsos nas pernas, uma camiseta justa com gola pólo rosa, e uma sandália rasteirinha. Não tinha costume de abrir mão do salto já que minha altura não era meu principal atributo, mas Suzana aconselhou que eu usasse algo bastante confortável porque iríamos caminhar bastante.

Pontualmente para meu alívio, Suzana interfonou comunicando que me aguardava, Dona Lúcia estranhava minha saída, já que desde que estava trabalhando para mim, nunca me viu sair de casa que não fosse para o hospital. Chamei o elevador que durou uma eternidade para chegar, quando enfim cheguei à entrada do prédio, ao me deparar com Suzana, encostada no seu carro, meu coração acelerou ainda mais, não contive um largo sorriso e caminhei apressada em sua direção.

Suzana usava short minúsculo, expondo suas pernas bem torneadas, uma camiseta regata, com um moleton amarrado no pescoço, e um tênis de atleta. Estava linda, absolutamente linda, aproximou-se para me cumprimentar com beijo de comadres, levantando o óculos de sol acomodando-o nos seus cabelos, em seguida olhou para meus trajes e comentou:

- Ora doutora, muito bem, está parecendo uma carioca... Mas sinto falta de alguns centímetros seus... Perdeu durante o sono?

- Primeiro, que tal esquecer o doutora, doutora, pelo menos hoje? Segundo, é um elogio ser carioca? E por fim, engraçadinha você heim? - respondi dando um tapa em seu braço.

- Primeiro, aiii... - retrucou esfregando a mão no seu braço. – Segundo, é um elogio sim, e terceiro, entre no carro Isabella, temos uma programação extensa hoje!

Seguimos pela linha vermelha saindo da Ilha, e ela me mostrava cada por menor das paisagens que passávamos, por diversas vezes me perdi em tanta informação que ela me passava, mas a culpa era do meu encantamento...

Eu não conseguia fixar minha atenção nas informações por estar perdida no movimento de sua boca... No cheiro dos seus cabelos que me inundava quando ela os jogava de lado... ela tocava minha perna chamando minha atenção para algumas construções, esse gesto simples provocava em mim um furacão de sensações inéditas.

O dia foi de fato intenso, ela ansiava em me mostrar tudo, primeiro o Cristo Redentor, a paisagem daquela cidade era algo inexplicável, nunca havia visto algo parecido, a orla, a baía da Guanabara, e o mais importante, Suzana do meu lado falando perto do meu ouvido apontando para cada ponto daquele cenário, eu me sentia embriagada por aquele momento...

Saímos dali em direção ao Pão-de-Açúcar, e mais uma vez as paisagens me encantaram, Suzana me segurava pela mão me puxando incansavelmente... a sensação de ter minha mão entre a sua era indescritível, parecia uma adolescente apaixonada... Passava das 14h e a fome começou a dar sinais, Suzana me levou pra um restaurante simples, mas charmoso em Copacabana, em seguida passeamos pelo calçadão, estava nublado e um vento frio nos fazia apertar nossos braços em volta do corpo.

Conversamos amenidades, rimos, Suzana revelava um senso de humor inteligente, que se confundia com seu jeito descolado tão próprio dos cariocas. Sentamos em um banco observando uma partida de vôlei, quando uma fina garoa começou, Suzana num gesto delicado, percebendo meu desconforto com o frio, colocou seu moletom em volta dos meus ombros, dando uma piscadela com aqueles lindos olhos amendoados...

Sorri num gesto de agradecimento e num impulso segurei sua mão a depositando sobre sua perna... estava arrepiada, mas fingi não notar, não era a primeira vez que tocava sua mão, mas desta vez mantive ali sob seu corpo sem nada dizer, mas percebi que ela ajeitava seus dedos entre os meus, me causando uma excitação profunda.

Foi nesse momento que a chuva se tornou intensa, ela me puxou pela mão e corremos na direção do seu carro, entretanto, era uma distância considerável, por isso, paramos em baixo de uma barraca esperando a chuva amenizar para continuarmos, estávamos completamente encharcadas, sacudi meu cabelo que nesse momento ficou despenteado caindo sobre meus olhos, ela prestou atenção em cada movimento meu e não me contive:

- Algum problema, Suzana?

- Eh, não... é que seu cabelo sempre tão arrumadinho está bem diferente agora... - sorriu tímida.

- O seu não está tão diferente assim... E aaaatchimmm! – não contive o espirro.

- Acho melhor enfrentarmos a chuva e nos aquecer no carro, ficarmos aqui encharcadas não me parece muito prudente... - comentou preocupada.

Concordei sem comentar com ela da minha fragilidade respiratória, temendo que aquela situação desencadeasse uma crise de asma. Chegamos ao seu carro e ela rapidamente ligou o aquecedor, pegando um casaco que estava no banco de trás do carro e colocou sobre mim...

Há muito tempo não me sentia tão mimada por alguém... Tia Sílvia era bastante atenciosa comigo, mas eu não permitia ser paparicada e, no entanto, estava ali com alguém que conhecia há quatro dias, completamente a vontade me permitindo ser cuidada por ela...

O choque de temperatura, acelerou minha crise, continuei espirrando, depois tossindo, em poucos minutos, sentia o ar faltar, Suzana olhava preocupada, parou o carro e me perguntou:

-Bella você tem asma?

Eu só conseguia balançar a cabeça, enquanto procurava minha bombinha na bolsa, encontrando-a e inalando-a em seguida, eu começava a respirar com menos dificuldade e voltei-me para ela respondendo:

-Há algum tempo não tenho crise, mas...

- Estou me sentindo culpada, era pra voltarmos para o carro assim que começou a neblina... - Suzana disse contrariada.

- Tudo bem Suzana, você não tinha como prever, nem ao menos sabia da minha asma, deixe-me em casa por favor, amanhã estarei melhor – afirmei segurando seu braço.

- De forma nenhuma, não conseguiria te deixar em casa sozinha assim, doente. Você vai para minha casa, e hoje cuido de você, passamos na farmácia e compramos um corticóide, e um broncodilatador, administro em você, só assim ficarei tranqüila – Suzana falou em tom imperativo.

Como eu gostava de ouvi-la falar nesse tom... Me lembrava de como a conheci, dando ordens segura de si. Não a contrariei, até mesmo porque seria inútil, continuei respirando rápido sem poder de argumentação.

Suzana morava em Bonsucesso, seu apartamento parecia um estúdio, não tinha divisão entre sala e cozinha, só uma escada de uns cinco degraus largos que dava acesso a seu quarto, havia poucos móveis, mas os que haviam eram combinados em tom preto e branco, na sala alguns pufs e um sofá grande sobre um tapete branco felpudo, com uma estante com aparelhos de som com a TV dispostos em meio a alguns porta retratos.

Mal entrei no seu apartamento e Suzana já se apressou em me dar roupas secas, toalhas, enquanto eu me secava e retirava o casaco, ela preparava um chá, me abordou:

- Pode subir até meu quarto se quiser se trocar, vou pedir um remédio por telefone e já te examino também... Seu chá fica pronto daqui a pouco.

Eu estava tímida diante dos seus cuidados, mas subi as escadas, acompanhada pelo olhar de Suzana, a fim de seguir suas orientações e trocar de roupa. Vesti o pijama de flanela com estampas de ursinhos, meio infantil até, que ela me deu, prendi meus cabelos após secá-los, e desci ao encontro de Suzana que me aguardava com uma caneca decorada com o chá de ervas com limão que me preparou.

Puxou um banco da bancada da cozinha e mandou que eu me sentasse enquanto colocava o estetoscópio no meu peito, depois de pedir licença abrindo dois botões do pijama que usava.

Se minha asma não tivesse acelerado meus batimentos cardíacos nem tampouco minha respiração, a mão de Suzana próxima ao meus seios o faria sem o menor esforço. Ela se esforçava para manter uma postura profissional, quando eu tossi e perguntei:

- Tenho quanto tempo de vida doutora?

- Bom ouvir sua voz, pensei que não ouviria mais hoje... E pelo seu humor, você está melhor não? - respondeu com aspecto de alívio.

Sorri e tomei um gole do chá, voltei meus olhos para ela e disse-lhe com ar de advertência:

- Você também tem que trocar de roupas doutora, não quero ser responsável pelo mal estar da chefe... vamos lá, você vai se trocar agora mesmo!

Tirei o estetoscópio da mão dela e segui em direção ao seu quarto a empurrando pelas costas. Ela ria-se da situação, mas fez a minha vontade, sentei-me em uma poltrona próxima a uma grande janela no seu quarto observando-a escolher uma roupa em seu armário.

Seus cabelos já estavam secos, ela os prendeu em forma de coque, puxou da gaveta uma camisola de seda estampada, e começou a despir-se parecendo não se importar que eu estivesse ali, nesse momento tive medo de ter outra crise de asma tamanha minha emoção ao ver aquela barriga tão bem definida, seus seios firmes, e aquelas curvas... Ela usava um calcinha de algodão com laços na lateral, aquilo pra mim surgia como uma referência de sensualidade incomum. Deixou a camisola ajustar-se ao seu corpo, e me olhou, eu estava completamente absorta com aquela imagem, e temo que não soube disfarçar meu prazer de vê-la daquele jeito.

- Pronto, doutora, está do seu agrado? - falou colocando as mãos na cintura esperando uma resposta.

- Sssim... Sim, bem melhor assim – gaguejei mas ainda pensava, bem melhor seria só com aquela calcinha fofa...

Levantei-me da poltrona e me dirigi às escadas, quando senti as mãos de Suzana envolvendo meus braços, aquelas mãos me desestruturavam, parei de andar, e joguei meu pescoço pra trás procurando o corpo de Suzana, que se aproximava do meu. Foi quando senti que sua boca chegava a minha nuca, seus lábios roçavam nos meus cabelos presos, eu estava completamente envolvida, fora de mim, não ligava que aquele corpo que causava todas aquelas sensações fosse um corpo feminino, e que corpo! Foi então que a campainha tocou, e fomos arrancadas daquele momento... Era a entrega da farmácia... Maldita hora pra meu remédio chegar...

Suzana desceu rapidamente, recebeu a medicação e se dirigiu ao sofá onde eu estava sentada, recuperando meu fôlego, sentou-se ao meu lado e disse:

- Vou preparar algo pra comermos, em seguida você toma a medicação, tudo bem?

- Ahan... - respondi baixando a cabeça.

Ambas não conseguimos tocar no assunto acerca daquele momento no seu quarto, liguei a TV enquanto Suzana preparou um macarrão. Ela me chamou para cozinha, não trocamos uma palavra, exceto quando elogiei a massa e ela agradeceu a gentileza.

A chuva não deu trégua naquela noite, e o frio se intensificava. Ao terminar o jantar, ajudei-a com a louça a contragosto dela que insistia que eu descansasse após tomar a medicação.

Sentamos no sofá com canecas de café, na TV, começava um filme de suspense, ficamos caladas assistindo comentando esporadicamente alguma cena, até uma em especial, na qual a protagonista é surpreendida pelo psicopata, foi quando segurei a perna de Suzana como num impulso, ela sorriu e comentou me fitando:

- Não tenha medo minha Bella, eu te protejo...



CAPÍTULO 4: A URGÊNCIA DE AMAR


Em um gesto igualmente impulsivo, retirei minha mão da perna de Suzana, que sorriu com minha reação. A chuva não cessava e talvez por isso, perdemos o sinal do canal que assistíamos ao filme, em seguida uma queda de energia deixou o apartamento no breu e, mais uma vez, avancei em direção a Suzana, buscando sua proteção.

Senti seu riso, ela virou-se em direção ao seu celular e o ligou para iluminar seu percurso até a estante, onde havia algumas velas decorativas, levou-as à cozinha e voltou para o meu lado, colocando uma vela na estante e outra na mesa do telefone, do lado do sofá.

Aquela penumbra definia ainda mais seus belos traços, seu rosto voltou-se para mim e num tom baixo de voz ela me pediu docemente:

- Relaxe, estou bem aqui do seu lado... Encoste aqui – falou apontando com as mãos para seu ombro.

Recostei-me sobre seu ombro nu, naquela posição, podia ver seus seios pelo decote da camisola, Suzana abraçou-me encostando sua cabeça na minha, ousei deslizar minha mão por sua cintura, deixando-nos abraçadas.

Eu podia sentir sua respiração acelerar, enquanto descia suas mãos pelos meus braços. À medida que ela apertava meu corpo contra o seu, proporcionalmente eu apertava sua cintura e, gradativamente, sentia meu corpo ser tomado por um calor incontrolável, misturado a um frio na barriga que descia para baixo do meu ventre...

Senti os lábios de Suzana quentes roçando na minha testa, sua respiração no meu rosto era quente, aquele roçar me excitava intensamente, impulsionando minhas mãos a passearem no abdômen de Suzana, que tremia com meu movimento.

Aquela dança de movimentos suaves durou alguns minutos, até que Suzana segurou meu pescoço com a mão que estava livre, deixando meu rosto de frente para o seu, fechei meus olhos respirando ofegante, dessa vez a minha asma era inocente...

Nossos corpos tremiam, até nossos lábios se encostarem, Suzana beijou-me delicadamente a princípio, até sentir minha boca se abrir, aí então ela me invadiu com sua língua quente, sugando a minha com voracidade. Eu correspondia aquele desejo seguindo os movimentos da língua e dos lábios de Suzana, esta foi impondo o peso do seu corpo sobre o meu e me deixei cair no sofá, segurando seu quadril, que buscava espaço entre as minhas pernas.

Instintivamente abri minhas pernas, enquanto subia minhas mãos por baixo da camisola de Suzana, sentindo a maciez de sua pele quente e arrepiada. Suzana movimentava-se em cima de mim enquanto suas mãos deslizavam-se por baixo daquele pijama que me aquecia, mas naquele momento pedia pra ser tirado imediatamente. Como quem escutasse meus pensamentos, Suzana abriu os botões e desceu pelo meu pescoço até meus seios, à essa altura com os mamilos rígidos, beijando e chupando em vários pontos. Nesse momento meu sexo estava inundado de tesão, percebendo isso, Suzana desceu suas mãos por baixo do elástico da calça do pijama, sentindo meu sexo molhado e trêmulo. Naquele movimento, eu apertava suas coxas, em um pedido que ela entrasse em mim e me tomasse como sua.

A sintonia dos nossos corpos era perfeita, Suzana parecia traduzir o que meu corpo pedia, assim, deixou–me inteiramente nua, devorando com sua boca cada pedaço meu, até que uma de suas mãos acariciou minha virilha. Eu já me contorcia convidando-a para me tomar inteira.

Ela não se demorou em aceitar o convite, penetrou-me com dois dedos massageando meu clitóris, o silêncio do momento foi rompido com gemidos mais altos, que não pude conter diante do prazer que sentia ali. Suzana intensificava as estocadas ajudando com movimentos de quadris sobre mim, enquanto lambia e chupava meu pescoço e meu queixo.

Quando eu estava prestes a explodir em um delicioso orgasmo, o qual nunca experimentara antes, Suzana parou, retirando seus dedos de mim, sorrindo maliciosa, sussurrando no meu ouvido:

- Ainda não...

- Como assim? Você vai me deixar nesse estado? Você é sádica por acaso? - desafiei-a com indignação.


- Quero que você goze comigo...

Continuou sussurrando, mordiscando minha orelha, descendo até meu sexo ensopado, beijando e lambendo minha virilha e deslizando até meus grandes lábios, alternando entre beijos e lambidas, afastou meus pequenos lábios com seus dedos e mergulhou sua boca ardente no meu sexo, empurrava sua língua sugando a explosão do meu gozo, eu empurrava ainda mais meu sexo na sua boca, enquanto liberava um gemido que parecia preso por vinte e três anos... Eu parecia experimentar uma libertação. Sem pensar, lambi a orelha de Suzana, que descansava sobre mim e ainda ofegante disse-lhe sensualmente:

- Quero sentir você em mim inteira... Quero sentir seu gozo... - disse isso levantando aquela camisola... Minhas mãos passearam até aquela calcinha de algodão que anteriormente me enlouquecera, e arranquei-a, puxando Suzana inteiramente nua sobre mim.

Continuei beijando-a com volúpia, e a joguei na posição contrária, ficando por cima dela, meu sexo ainda estava ensopado, e senti o mesmo no sexo de Suzana, rocei meu sexo com o seu, o que liberou gemidos roucos de Suzana, excitando-me ainda mais.

Quando me deliciava sugando seus seios, beijando sua barriga, enquanto via Suzana fechar os olhos e morder os lábios, fomos surpreendidas com a volta da energia elétrica, deixando-nos de repente tímidas com tanta luz.

Ficamos abraçadas por alguns minutos, ela acariciava meus cabelos, e eu retribuía o carinho, acariciando sua barriga. Sabíamos que havia muita coisa a ser dita, mas não existia disposição naquele instante, minha vontade era continuar o que a chegada da luz interrompera, nunca me senti tão segura e tão sedenta de alguém como estava com Suzana.

O momento de carinho foi interrompido pelos nossos celulares tocando ao mesmo tempo, era do hospital, éramos obrigadas a atender.




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