segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

1ª TEMPORADA: PORQUE SEI QUE É AMOR - capítulo 10

CAPÍTULO 10: DOCE ROTINA


Acordei com um “bom dia” suave ao meu ouvido. Suzana me beijou suavemente os lábios e mostrou-me a bandeja com o café da manhã, que ela mesma preparara. Com tom de um requintado maitre começou a listar os itens da bandeja fazendo biquinho como se falasse francês:

- Madmosele, aqui temos um delicioso sanduichê de presuntê, o iorgutê desnatadum, torradas com patê, uma suculentá salad de fruit, e claro um indispensável café com leitê.

Eu sorria sem parar daquela cena, talvez por isso, não hesitei em comer tudo que ela me oferecia, algumas coisas ela fazia “aviãozinho” com a colher, o que me deixava ainda mais boba. 

- Então, ainda está doendo muito?

- Não, só quando respiro mesmo – brinquei.

- Ai amor, jura? Daqui a pouco é hora do remédio, no final do dia você sentirá menos dor, vou trazer do hospital um pacote de curativos estéreis para trocar esse aí.

- Então quer dizer que você vai me deixar sozinha hoje, doutora? – fiz bico.

- Ai, não me olha assim vai... Se não eu não consigo sair daqui, nem trabalhar.

- Vai resistir aos meus olhos roxos? – pisquei rápido que nem personagem de desenho animado.

- Belaaaaa. 

- Tudo bem meu amor, estou brincando. Ficarei bem, qualquer coisa chamo D. Lúcia, vai tranqüila tá?

- Ela só vai embora quando eu chegar, vou tentar vir almoçar com você, dependendo do movimento por lá tá? 

Naquele dia, Suzana não conseguiu almoçar comigo, mas me ligou no mínimo umas dez vezes, também recebi ligação de Livia e Tia Silvia, que foram avisadas do meu acidente de trabalho por D. Lúcia. Ficaram nervosas, querendo vir cuidar de mim, só se tranqüilizaram quando expliquei o que de fato tinha acontecido, que não era mesmo nada grave. À noite, Suzana trocou meu curativo, após me dar banho, observando com cuidado os hematomas em minhas costas, me liberando daquela faixa que me incomodou o dia inteiro.

Nos três dias de atestado concedido por minha linda namorada, ela me cobriu de mimos, em uma noite, chegou acompanhada de um urso de pelúcia enorme, que segurava um coração escrito: TE QUERO. Durante o dia me mandava flores, sempre dando um jeito de ficar presente mesmo estando no hospital trabalhando.

Até minha recuperação total, Suzana praticamente se mudara pra meu apartamento, indo em sua casa só para pegar roupas, documentos. Foram dias maravilhosos. Até para me tocar ela era delicada, o fim do meu atestado médico foi devidamente comemorado com uma noite quente de sexo, quando Suzana retribuiu a minha cortesia e desfilou pra mim de lingerie de renda e cinta liga.

As semanas seguintes transcorreram numa rotina maravilhosa, no hospital nosso relacionamento não parecia mais ser segredo, éramos vistas sempre juntas, mas sem explicitar nada fisicamente. 

Comemoramos, dois, três, quatro meses de namoro, sempre de maneira romântica, sempre dançando de rosto colado as músicas que identificamos como nossas. Fazíamos tudo juntas, compras, cinema, praia. Com freqüência Suzana me ajudava nos estudos, nas pesquisas. Eu me destacava na residência, o que a deixava cheia de orgulho. No nosso aniversário de cinco meses de namoro, Suzana me levou para Teresópolis, alugou um chalé charmoso com lareira, fazia frio nessa época, curtimos e nos amamos por um fim de semana inteiro, estava tudo perfeito, eu entendia enfim, o que era felicidade.

Quando completamos seis meses de namoro, era minha vez de surpreendê-la, sabendo o quanto ela gostava de praia, a levei pra um fim de semana em um resort com praia particular em Búzios, era a primeira vez que cometia uma extravagância, mexendo na poupança que Tia Sílvia mantinha desde que meus pais morreram, onde tinha depositado parte de minha herança. Valeu a pena, Suzana parecia criança correndo na areia, me puxando naquela areia branca. 

No fim da tarde de domingo, quando voltávamos pro Rio, paramos na estrada pra ver o pôr-do-sol, abraçadas, eu recostada no seu colo, era minha morada aquele corpo...

- Amor, obrigada... Nossa, que presente você me deu!

- Você merece minha vida...

- Cada dia que passa, eu fico mais apaixonada por você... Parece que te esperei a vida toda...

- Eu sinto o mesmo... Ah amor... Quase esqueci, tenho um convite pra te fazer.

- Convite vindo de você só pode ser coisa boa.

- E é sim. No fim do mês, meus avós fazem bodas de ouro, e vai haver uma grande festa na fazenda da nossa família... Eu gostaria que você fosse comigo.

- Certeza, Bela? Não vão estranhar você aparecer comigo lá, assim te acompanhando?

- Não teriam porque estranhar, é uma amiga que conheci no Rio...

- Ah... Amiga... – falou com um olhar triste.
- Vem cá, amor – falei puxando seu corpo pra mais perto. – Eu não estou te dizendo que vou te apresentar como amiga, minha vontade era de chegar de mãos dadas com você anunciando que você é a dona do meu coração, o motivo de meu sorriso, do brilho dos meus olhos e razão desse meu ar abobado de felicidade. Mas entenda, nunca apareci com nenhum namorado pra minha família, não posso simplesmente em plena festa de Bodas de Ouro de meus avós, na qual toda a sociedade da região vai estar anunciando uma relação homossexual, isso chocaria demais... Concorda?

- Ahan... Então vou como sua amiga e nos agarramos escondidas?

- Não deixa de ser excitante, né? – falei mexendo as sombracelhas. – Mas meu intuito é que você conheça Livia e Tia Silvia pessoalmente, porque de nome vocês já se conhecem. De cada dez palavras que troco com elas, onze são de você...

- Quero muito conhecê-las também.

- Então... Acho que elas desconfiam de algo, nunca escondi nada de minha irmã, e quero contar a ela sobre nós, assim como para tia Silvia. Topa?

- Topo sim meu amor!

Avisei a Livia e Tia Silvia, da ida de Suzana, trocamos nossos plantões para ficarmos livres desde sexta, e viajamos de avião até Belo Horizonte, Livia nos esperava lá, para irmos de carro até Valença. 

Durante o percurso, Livia e Suzana conversavam como velhas conhecidas, amava esse carisma que Suzana tinha. Antes de chegarmos, ela estava nervosa, segurei suas mãos quase por toda viagem. 

Chegamos a Valença por volta de meio-dia, Tia Silvia nos aguardava no imenso alpendre que cercava sua casa, corri para os seus braços e nos abraçamos demoradamente. Não nos víamos há mais de seis meses, nunca ficamos tanto tempo separadas. 

- Meu pedacinho de céu! Que saudades... Merece um castigo por passar tanto tempo longe de nós. Está magrinha...

- Titia... Estou trabalhando muito, raramente tenho fim de semana ou feriado.

Não estava mentindo completamente, os poucos finais de semana e feriado que tinha passava com Suzana, mas eram poucos mesmo. Como chefe da emergência, Suzana era obrigada a cobrir muitas faltas de plantonistas em feriados e fins de semana. 

- Essa deve ser a famosa Suzana –tia Silvia dirigiu os olhos para Suzana, que observava encantada o jardim da casa.

- Isso, formalmente, tia Silvia, Suzana, Suzana, Tia Silvia. 

Tia Silvia abraçou Suzana da mesma forma que me abraçou. Ela, a princípio resistiu ao abraço, mas logo se entregou à simpatia de minha segunda mãe. Sentamos ali mesmo no alpendre nas espaçosas cadeiras de madeira ali dispostas. 

Célia, nossa empregada há muitos anos, tratou de pegar nossas malas junto com Virgílio nosso jardineiro. Conversamos alegremente em poucos minutos Célia nos avisou que o almoço estava na mesa. Pratos da culinária mineira enchiam nossos olhos: arroz com legumes, feijão tropeiro, assado de batatas, abobrinha sertaneja, e uma carne de panela divina! Os verminhos de Suzana devem ter vibrado, porque ela não se fez de rogada diante das mãos de titia sempre enchendo seu prato ao notar que se esvaziava. 

Célia trouxe as sobremesas, eu e Suzana parecíamos crianças perto de uma mesa de doces, até pra deixar Suzana mais a vontade, tratei de provar um pouco de tudo: baba de moça, bom bocado de queijo, doces de leites de todos os tipos, e compotas diversas. 

Depois dessa comemoração à gula, Tia Silvia nos levou aos nossos quartos, a fim de tirarmos uma pestana, estava com saudade desse hábito, sempre o fazia depois do almoço quando morava em Minas, no Rio fui obrigada a abandonar esse hábito. 

Suzana obviamente ocupou o quarto de hóspedes, que ficava no fim do corredor, vizinho ao meu quarto era o quarto de Lívia, em frente ficava o quarto de Tia Sílvia. Convidei Suzana para conhecer meu quarto, que era o mesmo desde minha adolescência, titia não mexeu em nada, exceto pela cama de solteiro, que substituiu por uma cama Box de casal, mas essa mudança fez ainda na época da faculdade a meu pedido, queria mais espaço na cama. Fez o mesmo no quarto de Lívia, na parede em cima da cama um quadro com uma foto minha tirada no dia de minha formatura, todo quarto era decorado com as cores lilás e branco, eram as minhas favoritas. Um closet espaçoso com algumas roupas e sapatos meus, uma escrivaninha perto da janela, ao lado da cama um criado mudo com um telefone sem fio lilás, um abajur e um porta-retrato com uma foto minha com Lívia e meus pais, tirada uma semana antes do acidente de carro que os vitimara, eu e Lívia usávamos roupa de montaria, de amazonas, até aquela época, competíamos em provas de saltos, depois da morte de nossos pais para a tristeza de vovô abandonei a prática, mas Lívia continuou até os dias atuais.

Suzana observou cada detalhe do quarto com atenção, parando nas fotos que encontrava, em cima da escrivaninha, uma foto minha com Tia Silvia e Lívia tirada na fazenda, e outra com Bernardo e Olivia durante o internato. Pegou na foto dos meus pais após Lívia sair do meu quarto e comentou:

- Você sempre foi linda Bela... Perdoe-me a redundância...

Aproximei-me dela, e a beijei suavemente, acariciando seus cabelos. A vontade que eu tive era de amá-la ali no meu quarto, oficializando a entrada dela no meu mundo de uma vez por todas, ali no meu cenário familiar. 

Tê-la ali representava muito pra mim, eu tinha a certeza que encontrara o amor de minha vida, não temi mais nada, nem uma reação ruim de minha família diante da revelação de nosso relacionamento, estava mais que convencida que não queria esconder esse amor. 

Cochilamos no meu quarto mesmo por algumas horas, Tia Sílvia acertava detalhes da festa no centro da cidade, Lívia a acompanhava, fiquei feliz e tranqüila notando o quanto minha irmã caçula estava madura, e o quanto ela cuidava de titia. Mostrei a Suzana o jardim o qual ela se encantou desde que chegou, sentamos em um balanço de madeira perto da piscina, aproveitando o final da tarde abraçadas.

À noite, titia nos levou para jantar em um restaurante afastado do centro, era do meu padrinho de batismo. César era o melhor amigo de meu pai, ficara viúvo a poucos anos, depois disso abandonou a medicina justificando que toda sua competência não impediu que ele perdesse as pessoas que mais amava para tragédias, primeiro meus pais em um acidente, depois sua esposa para o câncer. 

Sempre teve paixão por cozinhar, resolveu dedicar-se ao que lhe dava prazer, eu adorava seus pratos, que unia a culinária mineira a itens mais sofisticados. Como se tratava de uma cidade do interior, na presença de uma cara nova os buchichos começaram nas mesas com nossa entrada, a cara nova era minha deslumbrante namorada, que mais uma vez atraiu olhares de todos. Senti uma ponta de ciúmes vendo os olhos dos homens fixos nas curvas de Suzana que usava um vestido colado com um bolero por cima. Resmunguei baixinho:

- Tinha que usar esse vestido? Tem gente te despindo com os olhos!

- Mas só você me despe com as mãos amor – falou cochichando.

Avistei saindo da cozinha tio César, que não gostava que o chamasse de padrinho. Ele soltou um grito abrindo os braços, não se incomodando com o tom de voz na frente dos clientes, até mesmo porque seu restaurante era simples, decoração rústica mas de muito bom gosto:

- Minha bela menina!

Corri na direção de seus braços, ele abraçou forte me suspendendo do chão, sempre me abraçava assim, desde criança.

- Tio César! Que saudades!

Apresentei-lhe Suzana, e ele nos levou até sua melhor mesa segundo ele, era na varanda do restaurante, a vista dava pra chapada, imagino como deve ser deslumbrante durante o dia. Nem esperou nosso pedido, ele sabia das nossas preferências, exceto por Suzana, mas o prato dela, eu escolhi, um frango ao creme de milho, sabia que ela ia gostar.

Tio César se derreteu todo por Suzana, quando ela falou que era chefe da urgência, era o mesmo cargo dele no hospital regional. A noite só não foi mais agradável por causa da chegada de Artur, um primo nosso, que me atormentava desde a adolescência para namorá-lo, era amigo de Afonso, namorado de Lívia, ao saber da minha chegada à cidade, insistiu para acompanhar Afonso no restaurante.

- Ora se não é minha prima mais linda que está aqui! – Artur falou aproximando-se dos meus lábios.

Desviei meu rosto e o cumprimentei:

- Olá Artur, como vai?

- Bem, e não me apresenta essa deusa ao seu lado? – desceu os olhos pelo colo de Suzana com um ar cafajeste.

Minha vontade era de apresentá-la como namorada, e lhe estapear tirando aquele risinho dele da cara, mas seria insano. 

- Suzana esse é meu primo Artur –falei secamente

Suzana estendeu a mão e ele a tomou virando-a para beijar a face da mão dela. Aquilo me irritou profundamente, Suzana estava visivelmente sem graça.

- Estamos comendo Artur, não percebeu? Tinha que lambuzar a mão de Suzana? Você sempre deselegante... – falei demonstrando minha irritação.

- Quanta hostilidade priminha, tudo isso é ciúmes de mim? Você sabe que eu te amo, espero relembrar nossos momentos em breve... – mais uma vez o ar de cafajeste.

Era ciúme mesmo seu idiota, mas da minha namorada! Queria esquecer pra sempre aquela maldita festa que fiquei com esse imbecil na minha adolescência, mas ele sempre fez questão de relembrar. Percebi o desconforto de Suzana com aquele comentário do Artur, quando Tia Silvia anteviu um bate-boca entre os sobrinhos interveio:

- Ah Suzana, perdoe esses meus sobrinhos, parece que sempre voltam a ser crianças! Parem com isso, vamos pedir a sobremesa e voltarmos pra casa, o dia amanhã será cheio!

Artur enfim percebeu que não era bem vindo e se retirou, depois da sobremesa fomos pra casa conforme orientação de titia. Ainda conversamos alguns minutos na no jardim, na verdade titia e Suzana, eu me contentava em contemplar Suzana falar, seus gestos, seu sorriso, qualquer cego veria meu olhar apaixonado para aquela mulher. 

Fomos para o quarto, logicamente Suzana foi para o quarto de hóspedes, com um olharzinho pidão se despediu de mim e de tia Silvia no corredor. Cerca de meia hora depois eu ainda me revirava na cama sem conseguir dormir, sabendo que Suzana estava ali no quarto vizinho, e eu queimando de desejo por ela ali sozinha. Não me contive, e fui até seu quarto. Ela estava também acordada, tentando ler um livro, apenas o abajur estava ligado, adentrei sem bater na porta:

- Meu amor! O que você está fazendo aqui? Se sua tia pega você aqui como vamos explicar?

Eu não perdi tempo dando explicações, avancei sobre seu corpo, ficando de joelhos entre sua cintura, puxei o livro que estava em suas mãos, e a beijei sem chance de fuga:

- Isabela Bitencourt isso é assédio sexual! Você é lésbica? Estou chocada! – falou sorrindo maliciosa.

Imediatamente ela juntou seu corpo mais perto do meu, apertando meu bumbum com força, sugando minha língua, eu já estava invadida de tesão, quando senti sua mão por baixo de minha calcinha me penetrando, gemi, e me movimentava suavemente. Empurrei seu corpo contra a cama, e subi minha boca por suas pernas, sentindo com minha língua o calor que seu corpo me liberava, cheguei ao seu sexo, e lá me deliciei, Suzana gemia enquanto fincava suas unhas nas minhas costas, ao atingirmos o ápice. Permaneci sobre seu corpo, ouvindo sua respiração rápida, quando me dei conta que tinha que voltar ao meu quarto:

- Amor, preciso voltar pro quarto, vem comigo? Quero dormir juntinha com você, meu corpinho não sabe mais descansar sem o teu perto...

- E’ arriscado amor...

- Então fico aqui... E cedinho eu vou pro meu quarto... Livia sempre me acorda de manhã com um monte de beijo desde criança...

Assim adormecemos, assim que senti no meu rosto o sol, levantei-me, saindo do aconchego dos braços de Suzana, que para mim era o melhor lugar do mundo. Saí literalmente na ponta dos pés, fechando com delicadeza a porta, ao me virar em direção ao meu quarto segurei o grito de susto vendo de braços cruzados na porta do meu quarto, Lívia, olhando minha cara de criminosa após executar um crime.

-OH meu DE-US! –exclamou Lívia

-Shiiii – fiz um gesto com o dedo na boca, empurrando Lívia para dentro do meu quarto.

- Isabela Bitencourt você pode me explicar o que fazia saindo essa hora do quarto de sua “amiga”? – falou fazendo sinal de aspas, franzindo a testa. 

- Calma Livinha, eu vou explicar.

- Entrei no seu quarto pra acordar você como sempre, e olha aí, cama vazia! – falou apontando pra minha cama.

- Maninha... Eu e Suzana... Estamos juntas, há quase sete meses, eu a amo, estamos felizes e apaixonadas, ela é motivo de toda leveza na voz que você notou nos últimos meses...

Lívia parou na minha frente, mexeu nos cabelos, e me olhou sorrindo:

- Eu já sabia sua boba! Desde que você falou que a traria aqui eu tive certeza, você só fala nela, mana! Só queria ver essa sua cara nervosa me dando explicações! Por isso vim tão cedo te acordar – disse soltando uma gargalhada me abraçando.

Caímos na cama fazendo cócegas uma na outra, quando perguntei:

- Tudo bem pra você, Livinha?

- Por que não estaria, uai? Você tá feliz, finalmente se abriu pro amor, a Suzana é uma pessoa maravilhosa, linda, minha querida eu te amo, só quero seu bem...

Enchi meus olhos de lágrimas, e a abracei.

- Que fofa que essa minha irmãzinha é, te amo! Eu tinha tanto medo de você não aprovar...

- Só tenho uma queixa: você esperou sete meses pra me contar? Nossa sete meses? Agora que me dei conta... Isso é o triplo de tempo do seu maior relacionamento! Minha irmã tá crescendo, que lindo! – falou debochando, joguei-lhe um travesseiro no rosto.

- Lívia e Tia Sílvia? Você acha que ela vai aceitar? – perguntei apreensiva

- Isa... Titia é advogada, ela pega as coisas no ar... E nos conhece muito bem... Ela não comentou nada comigo, mas... Acho que ela suspeita sim, e a julgar pela forma como ela está tratando Suzana, ela aceitará sim... – apertou minha mão.

- Vou conversar com ela ainda hoje. 

Descemos para tomar café, mais uma vez mesa farta, Tia Silvia não parava de falar sobre as obrigações do dia, fez várias ligações, instruções a fornecedores, ela adorava organizar festas, eu e Livia comentávamos isso lembrando de cada festinha de aniversário nossa que ela transformava em evento social, ríamos falando dos detalhes enquanto ela fazia careta pra nós. Tratou Suzana com o mesmo carinho que tratou a mim e a Livia, eu estava encantada com aquela atmosfera familiar e o principal, Suzana fazendo parte dela. Após o café, deixei Suzana na companhia de minha irmã e segui com tia Sílvia até o jardim:

- Titia, podemos falar um instante?

- Claro meu anjo, preciso pegar umas rosas no jardim, me acompanha?

Passeamos de braços dados pelo jardim, pediu a Virgílio as rosas que precisava, e me conduziu até os bancos de madeira perto das roseiras.

- Tia Sílvia, não sei como vai reagir, mas aprendi com a senhora que a verdade é o que rege uma relação de confiança, e nunca, escondi nada da senhora...

- Claro meu anjo, vocês são meninas preciosas e sabem que podem sempre ser sinceras comigo...

- Então... Trouxe Suzana aqui por uma razão, gostaria que você e Lívia a conhecesse, por que ela é muito importante pra mim... Ela é...

- Sua namorada não é?

Olhei com surpresa, e relaxei diante da mansidão que seu tom de voz demonstrava:

- E’ titia... Estamos juntas há quase sete meses, e estou muito, muito feliz tia.

- Minha querida... Criei vocês com todo amor que guardei para os filhos que Deus não me concedeu, vocês me deram as maiores alegrias que uma mãe poderia ter, tenho orgulho das mulheres incríveis que vocês se transformaram, mas o que me realizaria como mãe é a certeza que vocês estão felizes, e sempre me preocupei mais com você Isa. Sempre tão responsável, dedicada a ser exemplo para Lívia, obcecada em se tornar uma médica tão brilhante como os seus pais foram, por mais que eu esforçasse em te cerca de carinho, sempre via nos seus olhos uma sombra de tristeza...

-Mas titia a senhora foi uma mãe perfeita pra mim sempre!

- Nunca me culpei meu amor, mas me entristecia vendo essa tristeza no seu olhar, vendo como você se cobrava e pensava, meu Deus, quanto mais essa menina vai sofrer? Mas, de uns meses pra cá notei na sua voz algo que nunca percebera antes, um vigor, um otimismo... Precisava olhar pra esses olhos azuis lindos pra ter certeza –segurou meu queixo entre seus dedos.

- Certeza de que titia?

- Que a sombra de tristeza do seu olhar não existia mais. Se o motivo disso é Suzana, meu anjo, é tudo que me interessa para amá-la como minha filha também, eu só quero sua felicidade! Você sofrerá alguns preconceitos com nossa família, você tem tios e primos muito estúpidos, mas estarei lá do seu lado como sempre, e te defenderei como uma leoa!

Não segurei minhas lágrimas, nos abraçamos por minutos ali, até ser interrompidas por Célia, trazendo o telefone sem fio, era do Buffet. Entrei em casa para contar a Suzana as boas novas, encontrei-a com Lívia, brincando de vídeo game sentadas no chão da sala, pareciam dois moleques viciados em jogo, gritando, xingando, vibrando. Esperei a partida terminar, e ao vencer, ela saltou no sofá onde eu estava sentada, se surpreendendo quando lhe beijei, parabenizando-a na frente de minha irmã.

-Ops... Desculpa Suzana – falei fazendo cara de espanto segurando a boca.

Olhei para Lívia, que segurava o riso, mas ao ver a palidez de Suzana, não nos contivemos, caímos na gargalhada, Livia, pulou no nosso meio, e disse:

- Bem vinda a família cunhada!

Contei a Suzana da minha conversa com Lívia e tia Sílvia, Suzana me ouvia esfregando minhas mãos nas suas, visivelmente ansiosa, mas com um sorriso sincero nos lábios. Passamos a tarde nos aprontando para a festa, a noite, seguimos com Livia e Afonso para a fazenda, tia Sílvia já estava lá desde tarde. Suzana estava linda, nos cabelos um coque deixando cair alguns fios sobre o rosto, um vestido vermelho com detalhes dourados as costas eram nuas, uma sandália dourada não muito alta a meu pedido, uma vez que ela já era bem mais alta que eu, de salto então, era uma humilhação.

Como era de se esperar a fazenda estava espetacular, tia Sílvia não poupou gastos com decoração, iluminação, era uma super produção. Como era de se esperar também, Suzana chamou atenção por onde passava, foi simpática com todos os que lhe apresentei, mas estava com as mãos frias e suadas, antes de conhecer meus avós. 

Minha avó se queixou todo tempo do meu sumiço, foi educada com Suzana mas não muito amável, ao contrário de vovô que se desmanchou em elogios, depois de me abraçar e manter suas mãos nos meus ombros enquanto conversávamos. Vovó era uma torcedora ferrenha do meu romance com Artur, ele já a envenenara contra Suzana, levantando suspeitas sobre nossa relação, não era difícil levantá-las depois do meu ataque de ciúmes no restaurante na noite anterior.

Durante a festa ele me desafiava com o olhar e provocava Suzana me puxando para dançar, beijando meu pescoço, não queria fazer um escândalo por causa de meus avós mas minha vontade era esbofeteá-lo ali mesmo na pista de dança. Afonso e tio César para acalmar os ânimos se revezavam em me tirar pra dançar dos braços de Artur, enquanto Lívia distraía inutilmente a atenção de Suzana passeando pelas mesas mostrando detalhes da decoração por ela escolhidas junto com Tia Sílvia. 

Saí a procura delas quando fui abordada por trás por Artur, perto da mesa dos doces, ele agarrou-me a cintura com força, já estava alcoolizado, eu tentava desvencilhar-me em vão, até que ele virou meu rosto pro seu e me roubou um beijo apressado e desconcertado, tentando colocar sua língua na minha boca, passando-a em meus lábios, não tendo forças para me livrar dele, mordi seus lábios com toda raiva que eu nutria por ele.

- Sua sapatão desgraçada! – ele gritou avançando em minha direção após ver suas mãos ensangüentadas por limpar seus lábios.

Senti a mão pesada dele no meu rosto, enquanto me apoiava numa coluna, ouvi o barulho da mesa de doces se desfazer com o corpo de Artur sendo arremessado contra ela. Era tio Ronaldo, pai de Artur, que o empurrara ao ver a cena.

- Levanta-se daí Pedro Artur, suma das minhas vistas agora!

Nesse momento, Lívia, vovó, Tia Sílvia, Suzana e Afonso se aproximavam depois de testemunhar a cena de longe. A banda que parara de tocar quando o estrondo da mesa de doces se desfazendo tomou o lugar permanecia imóvel. Vovó foi em direção a Artur para ajudá-lo a levantar, Afonso apressou-se em intervir a fim de evitar o esforço de vovó. Suzana examinava meu rosto, mas olhava para Artur com ódio mortal, a expressão de Lívia era a mesma para Artur e Afonso, uma vez que logo deduziu que Afonso comentara com seu amigo o que ela compartilhou sobre a minha felicidade em estar com Suzana. Vovô ordenou que a banda voltasse a tocar, os funcionários do Buffet já tentavam dar um jeito no estrago da mesa de doces, com as orientações de tia Sílvia. As pessoas cochichavam, mas aos poucos o ritmo da festa ia se reestabelecendo. Lívia e Suzana me levaram para dentro da casa grande, e em um dos quartos tratavam de me acalmar e cuidar de mim.

- Como foi isso Isa?

-Ai Lívia, você sabe como aquele idiota é... Não quero falar nisso... Quero ir embora, você pode pedir a algum empregado para nos levar? Não vou dormir aqui.

- Isa, tá na metade da festa ainda, vovô e vovó vão se chatear...

- Não Lívia, não volto pra festa com o rosto inchado depois desse incidente horroroso, amanhã venho e me despeço de vovô e vovó.

Entendendo que estava irredutível, Lívia saiu do quarto para providenciar o que pedi deixando Suzana comigo no quarto, que até então estava muda.

- Você acha que vai ficar roxo? Esse meu rostinho anda sendo castigado... – falei puxando assunto tentando minimizar o clima tenso.

Suzana se aproximou com compressas de gazes molhadas em soro fisiológico, limpando meu rosto, havia um arranhão apenas no meio daquela vermelhidão na minha face.

- Ei... Olha pra mim... Você tá com raiva de mim?

Suzana continuou a fazer o que estava fazendo e não me respondeu nada. Foi quando Tia Sílvia entrou de supetão no quarto:

- Deixa eu ver esse rostinho... Ai que eu vou esganar esse garoto abusado! 

- Tá tudo bem titia, exceto pelo bico da minha namorada...

Suzana arregalou os olhos pra mim sem graça por eu expor assim a reação dela. Percebendo que estava sobrando ali, tia Sílvia apressou-se em sair dali avisando:

- Não queria que vocês deixassem a festa, mas entendo, Virgílio vai levá-las no meu carro, está nos fundos da cozinha, podem sair por lá.

Agradeci e mais uma vez indaguei a Suzana:

- Então, vai olhar pra mim e conversar comigo ou não?

- Por que você tinha que dar tanta atenção praquele idiota Isabela?

- Você não notou que não tive opção? 

- Mas estava fazendo o que ali afastada de todos? Era só recusar a dançar com ele...

- Ele estava me provocando, queria evitar um escândalo, ficou fazendo piadas infames sobre me ensinar a gostar de homens de novo, ele estava bêbado, pra começar um escândalo será fácil.

- Nossa, e você evitou mesmo o escândalo né?

- Não tive culpa Suzana... Não vamos brigar vai... Estava tudo tão perfeito...

- Ai Isa, ver aquele cara te beijando, ai nojento! Se seu tio não tivesse batido nele, eu mesma faria isso! Sou judoca sabia?

- Ai que brava que essa minha namorada é... Vem cá meu amor, dá beijinho pra sarar aqui vai... 

Não duvidava que ela batesse mesmo no Artur, o ódio que ela estava era visível. Saímos pela cozinha como tia Sílvia recomendara, logo estávamos em casa, dormindo no meu quarto, depois de nos amarmos até a madrugada.Ao acordarmos depois do café, fomos para a fazenda, precisava me despedir de meus avós e dar explicações por ter saído da festa.

Na fazenda, encontrei Vovô já na varanda da casa grande, muitos empregados trabalhavam recolhendo mesas e cadeiras, ao ver o carro de tia Sílvia se aproximando comigo mesma dirigindo, ele foi ao nosso encontro:

- Pelas minhas contas, você deve ficar de castigo por uns 20 anos dona Isabela! Saiu na metade da festa sem se despedir... Nem dançou comigo né?

- Bom dia vovô... Sei que devo desculpas ao senhor, mas não tive condições de voltar a festa, sinto muito.

-Tudo bem... Perdôo você com uma condição: mandei preparar o Dourado, a pista tá pronta, monta pra mim?

- Ah vovô... Faz uns dez anos que não monto, Dourado nem me conhece mais, vou é ficar com o outro olho roxo!

- Eles nunca esquecem seu dono... Vamos lá, Dourado é cavalo de competição, está sentindo falta de uma amazona como você o montando, dê essa alegria ao seu velho aqui...

- Sei não vovô...

- Suzana! Você não gostaria de ver essa minha neta linda montando? Seu pedido ela atenderá...

- Gostaria sim Seu Antenor. Por favor, Isa... – fez cara do gato de botas do Sherek me olhando.

- Vocês estão de complô contra minha pessoa! Assim não tenho como negar.

Segui para o quarto, e peguei roupas de montaria de Lívia emprestadas, ela sempre as mantinha lá, já que ainda praticava com freqüência. Ao descer as escadas, vovó já me aguardava, olhando com cara de poucos amigos para Suzana, que estava sendo paparicada por tia Silvia e vovô. Puxou-me pelo braço enquanto Suzana me acompanhava com olhar de desejo me vendo de calças de montaria apertadas, botas cano longo, camisa branca justa, notando seu olhar a atiçava batendo o chicote nas botas e ajeitava o chapéu. No canto da sala, vovó me olhava séria:

- Isabela é verdade o que estão falando?

- Não sei o que estão falando vovó, o que estão falando?

- Sobre você essazinha aí...

- Não sei quem é essazinha, mas se você se refere aquela mulher linda ali, o nome dela é Suzana a mulher que está me fazendo feliz, se estão falando por aí que estamos juntas, sim, é verdade.

- Que vergonha, que decepção Isabela, ainda bem que seus pais não estão aqui pra sofrer essa humilhação?

- Vovó respeito muito a senhora, amo muito a senhora, mas não vou permitir que fale assim comigo, especialmente usando a memória de meus pais, tudo que fiz até hoje foi para honrá-los, e tenho certeza que estariam felizes vendo minha felicidade.

- Uma mulher linda como você, poderia ter o homem que quisesse...

- Mas só tem uma pessoa que eu quero, e ela está ali, sorrindo pra mim...é aquele sorriso que eu ter do meu lado pro resto da minha vida...eu vou sentir muito se a senhora não aceitar isso, mas nada que a senhora diga ou faça vai me afastar dela.

Afastei-me em direção a Suzana, Tia Sílvia e vovô, chamando-os para o desafio que vovô me fizera de saltar com Dourado depois de quase 10 anos sem montar. 

- Tá tudo bem amor? O que sua vó queria?

- Está sim minha vida...

- Você está deliciosa nessa roupa sabia?Acho que vou tirá-las ali mesmo no pasto, será que seu avô se incomodaria?

- Não sei... Quer que eu pergunte?

Suzana segurou minha boca, e seguimos rindo até as baias onde meu cavalo já estava pronto, Lívia também estava pronta para montar. Começamos nossa exibição, e Livia deu um show, eu um pouco destreinada, fiz uma apresentação modesta, mas que empolgou meu avô e encantou minha linda namorada. Quando voltávamos para almoçar na casa grande, Suzana cochichava:

- Quero que você galope assim hoje a noite... Em mim... - sorriu maliciosa.

Uma grande mesa estava posta em baixo de uma tenda usada na noite anterior no pátio da fazenda, nas panelas de barro, outras delícias da cozinha mineira, sentamos todos a mesa, Suzana do meu lado, vovó nos olhava com notável desaprovação, tia Laura, a mãe de Artur sequer me olhava, não pude deixar de notar o clima desagradável naquele almoço, mas me esforçava para que Suzana não percebesse. 

Enquanto Suzana limpava com um guardanapo inocentemente o meu rosto que estava sujo com farinha, ouvimos uma estridente batida na mesa, que calou a todos, quando nos viramos em direção ao som, estava lá o olhar impenetrável de vovó com uma voz de cheia de rancor esbravejando:

- Não vou permitir isso na minha casa!

Todos se perguntavam a que ela se referia, e ela continuava:

- E’ um pouca vergonha!

Eu sabia perfeitamente a que aquela conservadora senhora descrevia como pouca vergonha, mas fingi não saber. Vovô segurou a mão dela e falou entre os dentes trincados:

- Helena contenha-se, eu é que não vou permitir que você destrate ninguém na minha casa!

- Minha casa também, Antero! Se você quer acobertar a safadeza de sua neta com essazinha aí o problema é seu, mas eu não sou obrigada a ver isso.

Senti uma raiva crescer dentro de mim, desconheci minha avó naquele momento, joguei o guardanapo sobre a mesa, e levantei minha voz, mesmo com a mão de Suzana tentando me fazer parar segurando minha perna.

- A senhora tem razão vovó, não tem mesmo que ver nada, mas se referir a uma convidada nesses termos é de uma falta de educação sem precedentes.

- Cale-se Isabela, já ouvi demais de você por hoje, você está enfeitiçada por essa mulher, que deve estar de olho na sua herança!

- Já chega vovó, essa mulher é minha namorada, a mulher que eu amo, e que me faz a pessoa mais feliz do mundo, se a senhora não pode aceitar isso, é porque não me ama o suficiente, eu não perdoar a senhora por ofendê-la dessa forma! 

- Chegaaaa cala a boca Isabela, você não sabe o que está falando!

- Sei, vovó sei sim, nunca soube tanto como sei agora... Suzana me trouxe de volta a vida, se a senhora me amasse de verdade veria isso nos meus olhos.

Continuávamos discutindo mesmo com as tentativas de todos nos acalmarem, até que foi a vez de vovô bater forte na mesa, mas dessa vez ele usou uma garrafa de vinho, quebrando-a no canto da mesa:
- Chega Helena, não vou permitir que ninguém seja ofendido em minha casa, que comportamento lamentável... Não acredito que passei cinquenta anos casado com uma mulher mesquinha e preconceituosa como você acabou de se mostrar, essa face eu não conhecia.

Vovó tentava falar, mas vovô não permitia. Suzana, evitava levantar a cabeça deixando que vissem suas lágrimas, o que apertava ainda mais meu coração e aumentava minha raiva por vovó, queria protegê-la de todas aquelas palavras amargas. Até que vovó levantou-se da mesa, e com a voz embargada parou a minha frente e disse:

- Você é uma decepção pra mim, se não posso escolher quem senta na minha mesa, eu me retiro.

Suzana, a mais ofendida com aquela discussão, nesse momento ergueu-se olhou de cima minha vó, e falou num tom muito educado, mas cheio de mágoa:

- Não é necessário senhora, não imponho minha presença a ninguém, a casa é sua, se alguém deve se retirar, esse alguém sou eu. Seu Antenor obrigada pelo convite, o senhor é um cavalheiro foi um prazer desfrutar de sua companhia. Com licença a todos, boa tarde.

Suzana distanciou-se da mesa, quando eu me levantei e com os olhos marejados e voz embargada dirigi-me a vovó:

- Esqueça que sou sua neta, fique com sua casa, aqui não ponho mais os pés enquanto a senhora viver.

Acompanhei Suzana, segurei sua mão forte e seguimos pro carro de tia Sílvia. Vovô, tia Silvia e Livia correram em nossa direção tentando impedir que deixássemos a fazenda daquela forma:

- Minhas filhas, esperem, vocês não podem sair assim, Helena está fora de si!

- Vovô nada justifica o que ela disse... Por favor, nos deixe - o abracei em meio a lágrimas.

- Isa, Suzana, eu vou com vocês... Vocês estão nervosas demais pra dirigir.


Suzana chorava em silêncio, enquanto mantinha minhas mãos entre as suas. Entramos no carro, seguidas por Lívia e Tia Sílvia, que pediu a Afonso que levasse o carro de Lívia. No banco de trás, Suzana, recostou minha cabeça no seu colo enquanto enxugava minhas lágrimas, nenhuma palavra que titia e Lívia falava diminuía a dor que eu sentia, certamente nem a mágoa de Suzana. Chegando em casa, subimos para o quarto para preparar nossas malas. Ela me olhou enquanto eu me recostava na janela, e virou meu rosto:

- Isa... Por mais triste e doloroso o que acabamos de passar, especialmente pra você, porque afinal ela é sua avó, eu vou guardar pra sempre as suas palavras...

- Ah Suzana, não podia deixar minha avó te ofender daquela maneira.

- Eu juro que nem sei mais direito o que ela falou, depois de ouvir você dizer que me amava. Foi a declaração de amor mais linda, mais forte que eu já vi, e nunca ninguém me falou nada parecido... Eu enfrentaria um batalhão de donas Helenas pra ouvir de novo aquilo...

- Você não precisa enfrentar ninguém pra ouvir isso de novo meu amor: eu te amo, te amo, te amo mais que tudo minha vida...

- Eu também te amo, minha Bela – falou com os olhos cheios de lágrimas, e me beijou com ternura.

Titia nos interrompeu com uma bandeja com chá de camomila, reafirmou seu apoio a nós, e disse o quanto lamentava a atitude de sua mãe. Seguiu com Livia até Belo Horizonte naquela tarde, para nos acompanhar até o aeroporto, nos despedimos com o compromisso de não passar mais tanto tempo sem nos vermos pessoalmente.