Dezembro chegou. Seria uma festa para nós em outras circunstâncias. Mas aquilo que parecia tão sólido e encantado se desfez diante de mim quando eu menos esperava, em um momento tão delicado, confuso e por si só doloroso.
Estou cansada do silêncio do meu celular, do silêncio das minhas noites e dos vazios dos meus dias, hoje regados a companhia de anti-depressivos, ansiolíticos e soníferos com seus coloridos pretos e vermelhos em um canto seguro para minhas angústias serem amenizadas.
Estou cansada da minha cama vazia, e seu cheiro entranhado nela e em mim, por tanto tempo juntas, nossos cheiros se confundem, a ponto de não encontrar um perfume que não me traga pra perto o aroma de sua pele na minha.
Estou cansada de vagar pelos cômodos da minha casa e rever nosso primeiro e último beijos. Reviver cada chegada, cada partida, cada aventura, cada madrugada de amor, cada riso de felicidade e emoção nas reconciliações.
Estou cansada de rever os presentes e dos momentos que eles representaram. Estou cansada de dormir sem te dar boa noite e não te acordar com meu bom dia. Estou cansada de não ter mais as piadas que só nós duas entendíamos, cansada de ter que abrir mão todos os dias de um sorriso dedicado a você quando meu pensamento viajava até o seu.
Estou cansada de não te mimar e não ter seu conforto e segurança do meu lado. Cansada de cultivar uma saudade de alguém que parece não existir mais, exceto nas minhas lembranças que cada vez mais se tornam ilusões ou desilusões, não sei mais se minha língua consegue descrever momento tão oscilante e surreal.
A sensatez me manda esquecer, me ensina sobre amor próprio, me impulsiona a entender o que é um fim. Mas o coração... Ah esse maldito e ridículo coração, esse definitivamente não colabora com a razão... E me traz todo dia, aquelas canções, que se tornaram nossas e as que não eram, agora passam a ser, porque ironicamente o destino se encarrega de esfregar nos meus ouvidos cada pedaço de nossa história e da minha dor nos mais diversos intérpretes no meu rádio.
Vejo você em cada carro igual ao seu passando perto de mim. Vejo você em cada lugar que passamos juntas, revivo tudo, com saudade e dor, num misto de revolta comigo mesma e uma decepção profunda por ainda estar guardando com um carinho involuntário o que sensatamente deveria deixar no passado no momento que sua boca proferiu: ACABOU.
Um verbo, uma ação: ACABAR. Acabou de fato. Acabou uma parte de mim, acabou o visgo de felicidade, acabou a inspiração de uma escritora amadora, acabou com sonhos, acabou com planos, acabou sobretudo com a melhor parte de mim que você descobriu e levou junto com você. Acabar, sinônimo de egoísmo, covardia, desilusão. Mas quem ficou na solidão?
Solidão de não ter mais com quem dividir tudo...solidão que me deixa a cada dia mais vulnerável, você me disse"estarei sempre ao seu lado, você não está só" adivinha? Ilusão...
"Se ela me deixou a dor, a dor é só, não é de mais ninguém..."
Histórias e estórias, contos e romances, delírios e sonhos, fantasias para mulheres que acreditam no amor.
domingo, 2 de dezembro de 2012
terça-feira, 16 de outubro de 2012
Desculpas
Minhas queridas leitoras,
Há tempos deveria ter deixado aqui alguma explicação sobre meu sumiço. Quem me acompanha, sabe que nunca deixo de dar notícias, explicar-me quando preciso me ausentar, hora pela correria do trabalho, hora por problemas de saúde.
Não é do meu feitio abandonar contos, romances os quais começo a escrever. Em minha mente tinha grandes planos para essa web serie, e já esboçava meu primeiro livro, que pretendia escrever até próximo ano, por que a escrita além de um hobby delicioso para mim, já fazia parte de mim, da minha essência, adorava viajar nas personagens, no mundo delas, colocar um pouco de minha vida e de mim mesma em cada fantasia que eu criava.
Não convém detalhar os motivos pelos quais sumi, nem tampouco quero fazê-lo nesse momento. Decidi hoje deixar para vocês um pedido de desculpas pela falta de notícia, causando preocupação e acho que decepção em algumas também.
Parei de escrever por uma sucessão de fatos que me abalaram. Postei apenas uma pequena nota no face ressaltando meus problemas pessoais que estavam me impedindo de escrever.
Colocava em cada linha da minha escrita, aquilo que o amor me inspirava, e gostava de compartilhar com vocês a visão romântica daquilo que eu acreditava. Entretanto, nesse momento ainda preciso de tempo para me refazer, para não imprimir à minha escrita uma carga de amargura, desesperança e dor. Se eu conseguisse escrever algo sensato do romance que postava atualmente, acreditem, seria um desastre literário...
Quem sabe um dia eu volte a escrever, se ainda existe uma escritora em mim, certamente ela vai ressurgir no tempo certo. Se isso não acontecer, agradeço de coração a todas vocês pelo carinho dedicado, preocupação, atenção e sobretudo lealdade.
Abraços,
Melissa Monteiro.
Há tempos deveria ter deixado aqui alguma explicação sobre meu sumiço. Quem me acompanha, sabe que nunca deixo de dar notícias, explicar-me quando preciso me ausentar, hora pela correria do trabalho, hora por problemas de saúde.
Não é do meu feitio abandonar contos, romances os quais começo a escrever. Em minha mente tinha grandes planos para essa web serie, e já esboçava meu primeiro livro, que pretendia escrever até próximo ano, por que a escrita além de um hobby delicioso para mim, já fazia parte de mim, da minha essência, adorava viajar nas personagens, no mundo delas, colocar um pouco de minha vida e de mim mesma em cada fantasia que eu criava.
Não convém detalhar os motivos pelos quais sumi, nem tampouco quero fazê-lo nesse momento. Decidi hoje deixar para vocês um pedido de desculpas pela falta de notícia, causando preocupação e acho que decepção em algumas também.
Parei de escrever por uma sucessão de fatos que me abalaram. Postei apenas uma pequena nota no face ressaltando meus problemas pessoais que estavam me impedindo de escrever.
Colocava em cada linha da minha escrita, aquilo que o amor me inspirava, e gostava de compartilhar com vocês a visão romântica daquilo que eu acreditava. Entretanto, nesse momento ainda preciso de tempo para me refazer, para não imprimir à minha escrita uma carga de amargura, desesperança e dor. Se eu conseguisse escrever algo sensato do romance que postava atualmente, acreditem, seria um desastre literário...
Quem sabe um dia eu volte a escrever, se ainda existe uma escritora em mim, certamente ela vai ressurgir no tempo certo. Se isso não acontecer, agradeço de coração a todas vocês pelo carinho dedicado, preocupação, atenção e sobretudo lealdade.
Abraços,
Melissa Monteiro.
quarta-feira, 25 de julho de 2012
Beautiful Dangerous - Quarto episódio
EPISÓDIO 4 – O
início da lista
Praia de Ipanema, manhã de domingo.
-- Deixa, deixa é minha!
Fernanda
berrou antes de se jogar na areia para alcançar a bola e levantá-la para a
parceira de jogo fazer o ponto.
-- Yes! Isso aí parceira!
Fernanda
cumprimentou a parceira de jogo com uma típica tapinha no bumbum pelo set point
do jogo que lhes deu a vitória.
Assistindo
ao jogo estava Gisele. Atenta não só a habilidade de Fernanda como jogadora,
mas principalmente a excelente forma da policial, com as suas formas
maravilhosas naquela pele bronzeada incrivelmente sensual.
-- E aí? Gostou do jogo?
Fernanda
perguntou pegando a garrafa de água que Gisele lhe oferecia.
-- Muito...
Gisele
disse medindo Fernanda dos pés a cabeça mordendo os lábios. Os óculos de sol no
rosto de Gisele impediam Fernanda de ver o olhar de cobiça da amiga, mas o tom
a denunciava. A policial ignorou mudando de assunto:
-- E aí? Cadê sua hóspede
indesejável?
-- Sei lá... Deve estar se
afogando por aí só pra pegar algum salva-vidas... Ela não para quieta Nanda!
Ela muda tudo de lugar, cumpre todas as minhas vontades, só que ao contrário
sabe?
Fernanda
acenou em acordo sorrindo.
-- Claro que sei. Você não lembra
o que ela fazia com nossos planos de final de semana? A Dulce tinha sempre que
mudar nosso roteiro.
-- Ela é especialista em mudar
rotinas!
As
duas riram concordando.
-- Você se lembra do final de
semana que combinamos de pegar uma corzinha lá em casa na piscina quando meus
pais viajaram? Era um programa tipo, só de nós três, foi um sacrifício meus
pais deixarem eu ficar só em casa, só deixaram porque meu tio se prontificou de
nos dar assistência lá, já que morava vizinho.
-- Claro que lembro Nanda! A
Dulce convidou metade da escola, e quando a gente se deu conta, tinha virado
uma festa e seu tio chegou lá com a polícia!
As
duas gargalharam.
-- Fiquei dois meses de castigo!
– Fernanda disse gesticulando.
-- É, foi pouco tempo depois do
acidente com a...
As
duas se encararam e Gisele se cortou. Silenciaram como se tocassem em um
assunto proibido. Nesse momento Dulce se aproximava ofegante.
-- Ai, a gente devia ter deixado
o carro mais perto Gi!
Dulce
disse cortando a respiração e tomando a garrafa de agua da mão de Fernanda.
-- Eu deixaria se você não
tivesse se assanhado toda quando viu uma dúzia de par de coxas cabeludas
jogando futebol. – Gisele disse indignada.
-- Ah, bando de homem fraco, com
uma mulher dessas como eu qual a graça de correr atrás de uma bola? Era pra eu
ter vindo pra cá...
Dulce
disse olhando para as colegas de jogo de Fernanda.
-- Ow Dulce! Quando é que você
vai se decidir entre um pinto e uma perereca heim?!
Fernanda
disse dando uma tapinha no braço de Dulce, tomando de volta a garrafa de água.
-- Por que eu preciso decidir? São
só duas opções Nanda, não é um self service de 100 sabores de sorvete. É como a
casquinha do Mc Donalds, baunilha e chocolate, escolho misto!
Foi
inevitável para Gisele rir.
-- É mesmo a confusão em
pessoa... – Fernanda disse balançando a cabeça negativamente. – Vou dar um
mergulho, alguém me acompanha?
As
amigas recusaram o convite. Fernanda deu de ombros, tirou o microshort que
usava como saída de banho, exibindo o biquíni minúsculo e andou graciosa em
direção ao mar, sob o olhar atento das amigas.
-- Eu toparia... Encararia
tranquilamente... – Dulce disse se abanando.
-- O mergulho no mar? Então vai
Dulce!
-- Que mané mergulho! Estou
falando da Nanda!
-- Da da da Nanda?!
-- Que que é? Acha que só você
pode?!
-- Eu?! Você está louca Dulce? O
que tinha nessa água que você bebeu?
-- Ah pra cima de mim Gisele?
Você pensa que não sei o que vocês faziam naquelas aulas de reforço de
biologia?!
-- Estudávamos oras!
-- Sei... Anatomia feminina né?
Nervosa
e ruborizada, Gisele balançava a perna negando a insinuação da amiga.
-- Não sei de onde você tirou
isso!
-- Ah fala sério! Vocês chegavam
no dia seguinte com chupões no pescoço, arranhões... Com cada desculpa
esfarrapada...
-- A gente tinha quatorze anos
Dulce, a gente só treinava beijo pra não fazer feio com os meninos!
-- Sei...
Dulce
encarou Gisele com um olhar irônico. Fernanda voltou do mar ainda mais sexy com
as gotas de água escorrendo por sua pele.
-- Está quente mesmo hoje né
gente?!
Dulce
disse secando a morena com os olhos.
-- Uhum... – Gisele concordou
automaticamente.
-- Deviam dar um mergulho, a água
está uma delícia.
-- Delícia mesmo... – Dulce disse
observando Fernanda se vestir. – Quer dizer, parece estar uma delicia mesmo,
assim, olhando... Verde...
Gisele
escondeu o riso.
-- Então gente, vamos almoçar?
Tem um restaurante aqui perto que tem um peixe com molho de camarão fantástico!
– Dulce disse.
-- Não vai dá gente, almoço em
família hoje. Aniversário da vovó, eu não posso faltar. – Fernanda disse.
-- Ain! Aniversário da vó
Mercedez? – Dulce perguntou.
-- É sim.
-- Nanda me leva! Sua mãe vai
fazer aquela paella não vai? – Dulce falou melosa.
-- Com certeza! – Fernanda
respondeu sacudindo as pontas dos cabelos molhados.
-- Ain... Nanda me leva! – Dulce
insistiu.
-- Imagina se vou levar você para
o meu resto de domingo sossegado!
-- Nanda você não está
entendendo! Eu sonho com essa paella todos esses anos... Já provei tantas, mas
nenhuma se compara com a da sua mãe, eu imploro me leva!
Dulce
se ajoelhou diante de Fernanda dramatizando.
-- Levanta daí Dulce, deixa de
palhaçada! – Fernanda disse.
-- Não levanto enquanto você não
me disser que vai me levar. Minha boca já está salivando imaginando aquele
sabor...
Fernanda
puxou a amiga pelo braço e disse:
-- Tá! Eu levo!
-- Oba! Tá vendo como meu drama
funciona?
Dulce
saltou, deu um beijo no rosto de Fernanda e piscou o olho para Gisele.
-- É muito besta mesmo! Eu teria
te levado de qualquer jeito bobona! Minha mãe pediu que chamasse vocês.
-- Ah é? Por que você disse que
não ia me levar então?
-- Só pra ver seu draminha, além
do mais era uma fantasia minha, te ver ajoelhada diante de mim...
Fernanda
disse faceira, caminhando em direção ao carro e não ouviu o que Dulce deixou
escapar, só Gisele escutou:
-- Minha fantasia também me
inclui de joelhos diante de você, mas fazendo coisa bem mais interessante...
Gisele
arregalou os olhos.
-- O que foi que você disse
Dulcinha?
-- Só disse que estou com água na
boca! De imaginar minha fantasia se realizando... – Dulce cochichou a segunda
frase.
-- Dulce! – Gisele repreendeu.
Dulce
ignorou a repreensão da amiga, feliz com o resultado de sua provocação, Gisele
estava com as bochechas rosadas e o colo igualmente ruborizado, sinal de que
estava nervosa.
-- Gi, não vai fazer xixi agora
tá?
Gisele
dessa vez estapeou a amiga que saiu correndo.
*********
-- Nandita! Entre minha querida,
dá cá um beijo na sua velha!
Dona
Mercedez, a aniversariante recepcionou a neta e as amigas.
-- Oi vozinha! Parabéns! Trouxe isso para você – Fernanda entregou o
embrulho de presente – Lembra se das minhas amigas do colégio? Dulce e Gisele.
-- Oi Dona Mercedez, parabéns!
As
duas amigas disseram juntas abraçando a senhora simpática.
-- Finalmente chegou heim Belita!
A
mãe de Fernanda, uma senhora de seios fartos, ancas largas, e um rosto
belíssimo, se aproximava berrando.
-- Mãe! Não me chame por esse
nome!
-- É seu primeiro nome! Belíssimo
por sinal!
Agustina
disse abraçando a filha.
-- Tão belo como você. Mas que
roupas são essas? Cheia de areia... Belita vá tomar um banho agora mesmo!
-- Mãe! Belita parece nome de
cadela poodle!
-- Passa pro banho já!
-- Olha aí, até a senhora está me
dando comandos de cachorro! – Fernanda protestou.
-- Belita não discuta comigo! Esse
nome foi seu avô que te deu!
-- Foi por isso que a senhora o
matou né vozinha? – Fernanda brincou.
Dona
Mercedez gargalhou.
-- Para de falar asneira menina!
Vá tomar um banho e vestir uma roupa decente! Deixe-me falar com essas meninas
lindas, como vão meninas?
Agustina
abraçou com ternura Dulce e Gisele enquanto Fernanda subia as escadas sob
protestos.
A
família de Fernanda era de ascendência espanhola, como a maioria dos imigrantes
europeus no Brasil chegou fugindo da miséria causada pela segunda Guerra
Mundial. Construíram seu patrimônio que não era grande com muito esforço e
trabalho. Não eram ricos, mas, gozavam de uma vida razoável.
A casa espaçosa na zona norte do Rio, era a
mesma da infância de Fernanda, lugar bastante conhecido tanto de Dulce, como de
Gisele. Como era a casa mais próxima do Colégio Nossa Senhora das Graças, era
sempre a mais visitada entre as amigas.
Cerca de meia
hora depois de subir ao seu antigo quarto, Fernanda retornou usando um vestido
estampado, pelo tamanho que estava em seu corpo, certamente era da sua
adolescência.
-- Que hermosa! - Dona Mercedez
disse ao ver a neta.
-- Mãe tá faltando uns vinte
centímetros de pano nesse vestido!
Fernanda
reclamou puxando o vestido para baixo.
-- Belita se você puxar mais, vai
mostrar os peitos!
Agustina
exortou trincando os dentes, disfarçando com um sorriso. As amigas de Fernanda
não esconderam como se divertiam com a situação.
-- Vou servir o almoço, venham
meninas! - Agustina convidou.
-- Está uma gracinha com esse
vestido Belita! – Dulce provocou.
Fernanda
praticamente rosnou para a amiga. Gisele ao contrário não zombou do vestido
juvenil e romântico da morena, esticou os olhos e conferiu as pernas torneadas
da policial e suspirou.
Depois
do almoço, o qual Dulce se esbaldou, acomodaram-se no deck.
-- E vocês meninas? Casaram?
Trabalham em que? – Agustina perguntou.
-- Sou jornalista. – Dulce foi a
primeira a responder.
-- Eu sou... Trabalho em uma
editora de livros. – Gisele foi evasiva.
-- Trabalhos sem risco,
tranquilos, de moças estudadas. – Agustina alfinetou.
-- Mãe fala logo o que a senhora
quer falar, vamo lá, fala! – Fernanda bufou.
-- Não estou querendo dizer nada
Belita... Só estou comentando que suas amigas estão seguindo a carreira que
começaram a construir em uma faculdade, só isso...
-- Mãe eu também estou seguindo
minha carreira da faculdade!
-- Correndo atrás de bandido na
rua? Minha filha não é bem isso que um advogado faz!
-- Você é advogada?! – Dulce
perguntou surpresa.
-- Não, eu me formei em direito,
tirei OAB, mas sou policial... – Fernanda retrucou. – Mãe, uso meu bacharelado
na minha profissão, é bastante útil, também estou fazendo carreira. Quando a
senhora vai entender isso? Nunca pensei em ser uma advogada almofadinha usando
terninho risca de giz falando rebuscado num tribunal defendendo bandidos e
safados! Minha intenção sempre seguir carreira na polícia.
-- Isso é verdade. Ela falava
isso desde criança. Disse que ia ser a melhor policial de todas, e ela é – Gisele
lembrou orgulhosa. – A senhora devia se orgulhar dela tia Agustina.
Fernanda
sorriu discretamente para Gisele em agradecimento.
-- Veja, não é que eu não me
orgulhe da minha filha, ela é corajosa, destemida, sei que ela é muito boa no
que faz. Mas meu coração de mãe sofre! Fico com o peito apertado quando assisto
o noticiário anunciando troca de tiros entre policiais... Justo em uma cidade
com Rio de Janeiro, todo dia morre alguém da polícia! – Agustina desabafou.
-- Mãe, eu já expliquei pra senhora.
Sou uma investigadora, meu trabalho não é como um policial militar que fica nas
ruas fazendo segurança... Claro que eventualmente persigo algum criminoso,
alguns reagem à prisão, mas isso não é uma rotina...
-- Mesmo assim Belita! É
arriscado!
Agustina
disse nervosa com os olhos marejados. Nesse momento, Dona Mercedez se aproximou
dizendo:
-- Depois reclama que a menina
não aparece aqui. Fica nessa choradeira sempre!
-- Ah mamacita! A senhora nem
venha, sei que a senhora vive angustiada como eu! Quase põe fogo na casa todo
dia acendendo uma caixa de vela pra tudo que é santo! Pensa que não escuto suas
orações?
Fernanda
riu com as amigas.
-- E você devia fazer o mesmo!
Rezar e só!
Dona
Mercedez afagou o ombro da filha depois sentou-se ao lado de Fernanda.
-- Nós temos muito orgulho da
policial, da mulher que você se tornou minha querida, estamos sempre aqui
rezando e torcendo por você. Mas, não nos maltrate tanto! Apareça aqui de vez
em quando pra visitar essas duas velhas viúvas que te amam tanto!
Fernanda
deu um beijo no rosto da avó e sorriu.
-- Tá bom abuela...
Fernanda
ainda segurou a mão de Agustina e disse:
-- Eu sei me cuidar mãe, não
sofra tanto tá?
*********
Da
sua mesa, Fernanda observou Leticia saindo da sala de Wellington. Ferreira
observando a mesma cena se aproximou comentando:
-- O delegado parece que se deu
bem heim? Aliás, muito bem! Que gostosa que é essa doutora!
Fernanda
olhou para o colega com reprovação.
-- Ah qualé Garcia? Vai dizer que
ela não é gostosa?
-- Vou dizer nada! Que tal parar
de falar asneira e trabalhar? Fez o que pedi? Cruzou os dados da lista que te
dei com fichas policiais?
-- Que humor heim?! Mas sim, fiz
o que você me pediu. Mas daquela lista apenas cinco são fichados, delitos
menores, nada sério.
-- É pode onde vamos começar.
-- Sessenta e cinco suspeitos é
uma lista considerável... Você acha que conseguimos averiguar essa lista toda
em quanto tempo? Tem cidades de todo estado aqui.
-- É... Não será tarefa fácil, se
tivermos sorte, eles vão colaborar nos fornecendo amostra por livre e
espontânea vontade, se não, vai ser um trabalho de cão conseguir isso de outra
forma!
-- Se pudermos filtrar mais essa
lista, é melhor. – Ferreira comentou.
-- Também estou pensando nisso,
especialmente porque esse casos notificados são só do Rio de Janeiro, e se o
cara morava em outro estado quando contraiu essa doença?
-- Aí o caso foi notificado em
outro estado né?
-- Hurrum... Vou conversar com a
doutora Letícia e com a Gisele, quem sabe elas consigam descobrir mais
elementos que nos ajudem a diminuir essa lista.
********
Fernanda
encontrou Leticia em sua sala, concentrada, mexendo em seu laptop.
-- Doutora Letícia? Posso entrar?
-- Oh! Entre, por favor, investigadora.
-- Estou atrapalhando algo?
-- Nada que não possa esperar. Só
terminando um artigo para publicar. Entre, sente-se, por favor.
Fernanda
aceitou o convite e se sentou diante da mesa de Leticia. O simples fato de estar
perto da legista mexia com os sentidos da policial. O perfume doce da ruiva
atiçava a vontade de estar mais próxima, aumentava a temperatura da sua pele, a
visão dos traços delicados e gestos elegantes da médica despertava o
descompasso do coração da morena, as mãos suavam até mesmo o tom da voz da
ruiva, desestruturava Fernanda.
-- Então... O que a traz aqui
agente Garcia?
O
efeito de Fernanda em Leticia não era diferente. Aquela tempestade de
manifestações estranhas do seu corpo e pensamento era completamente nova para a
legista. Algumas delas ela não podia
controlar: seu rosto corava, seus olhos brilhavam, a respiração acelerava.
Aquela inquietude trazia para a vida de Leticia uma situação inédita, pela
primeira vez, ela não tinha explicação para as reações que experimentava desde
que conhecera Fernanda.
-- Agente Garcia?
Letícia
insistiu arrancando Fernanda da distração.
-- Ah! Oi, desculpa. Estou
tentando diminuir aquela lista de suspeitos, vim pedir ajuda, de repente tem
algo que você tenha notado... Enfim, algo que filtre um pouco mais esses
resultados... Por que enquanto nós procuramos suspeitos, o assassino pode agir
de novo, tempo é fundamental nesses casos...
-- Entendo. – Letícia respondeu
pensativa.
-- Além do mais, são muitas
amostras para coletar, contar com a boa vontade das pessoas...
-- É verdade, ninguém é obrigado
a fornecer provas contra si mesmo não é?
-- É...
-- Agente Garcia, eu vou reler o
laudo, rever o vídeo, se eu notar algo novo te digo.
-- Vou falar com a Gisele também.
Ela ofereceu uma espécie de consultoria para traçar o perfil do assassino já
que ele está se inspirando nos livros dela...
-- Ah! É uma boa ideia. Que
gentil da parte dela se oferecer para isso.
Fernanda
concordou com um sorriso.
-- Amizades assim são raras,
depois de tantos anos, vocês continuam tão íntimas, a Gisele parece confiar em
você incondicionalmente.
-- É... Nem imaginava
reencontrá-las, ainda mais nessa situação... Nós quatro fizemos mil planos de
irmos até pra faculdade juntas, mas acabou que nos separamos bem antes disso...
-- Quatro?
Antes
que Fernanda explicasse, Wellington entrou na sala.
-- Com licença doutora. Garcia?
Mudou de setor agora? Vive importunando a doutora Leticia agora?!
Fernanda
se preparava para responder a provocação do delegado quando Leticia interferiu:
-- A investigadora Garcia não me
importuna, estávamos trabalhando delegado. Duas cabeças pensando juntas pensam
melhor do que apenas uma, é como diz o dito popular.
-- Qualquer coisa que descobrir
me avise doutora, por favor.
Fernanda
disse se levantando, em direção a porta, passou por Wellington. Como um cão
aguçando o faro, aproximou o nariz do chefe e fez uma careta.
-- Credo delegado que perfume é
esse? Enxofre com suor de gambá?!
-- Você é uma ignorante até no
olfato! Saiba que esse perfume é francês!
-- Só se for o francês de um
camelô lá do Saara!
Leticia
segurou o riso olhando para a careta de Fernanda. Wellington constrangido mudou
de assunto para fugir da zombaria da policial:
-- Doutora eu vim convidá-la para
almoçar. Inaugurou um restaurante italiano aqui perto, e pensei que pudéssemos
experimentar. Que tal?
Fernanda
profundamente incomodada com o cerco do delegado à médica baixou os olhos,
colocou as mãos no bolso da frente da calça como se quisesse ficar invisível.
Letícia nada à vontade com a situação sem graça respondeu:
– É... Eu estou com muito trabalho aqui, acho
que não conseguirei nem almoçar hoje.
-- Que é isso doutora? Ficar sem
almoçar? Como médica a senhora sabe que isso não está certo!
-- Vou comer uma salada que
trouxe daqui a pouco. Obrigada delegado.
Decepcionado,
Wellington saiu da sala. Tentando disfarçar a satisfação pela recusa de
Letícia, Fernanda brincou:
-- Ia sugerir que você exigisse
que ele tomasse banho antes de sair com você...
Letícia
deixou um sorriso escapar.
-- Você acha mesmo que eu
aceitaria almoçar ao lado dele?
Fernanda
balançou a cabeça negativamente sorrindo.
-- Vou deixar você trabalhar
então.
Trocaram
um sorriso quase tímido sem esconder o brilho diferente no olhar uma da outra.
******
Carol
surpreendeu Fernanda no elevador. Outra vez, a policial carregava sacolas com
comida.
-- Giullianos? Você comprou comida no restaurante italiano
novo?!
-- O que tem?
-- Nanda você almoça um PF de
oito reais na padaria do portuga! E por que você está trazendo pra cá? E a
cantina agora é no quinto andar?
Carol
encheu a amiga de perguntas.
-- Ai! Que interrogatório é esse?
Coisa mais chata!
-- Nanda você está levando almoço
pra doutora né? – Carol perguntou segurando o riso.
-- Não enche Carol!
Fernanda
disse saindo do elevador.
-- Investindo heim? Do dogão do
Aguiar pro Giulianos...
A
policial fez um gesto qualquer aborrecido e caminhou em direção a sala de
Leticia.
-- Doutora? Desculpe-me
interromper de novo, mas ouvi você comentando que estava com muito trabalho e
que não teria tempo de almoçar... Trouxe algo para você comer.
-- Aquele cachorro quente? Jura?
Estava desejando um...
-- Ops...
Fernanda
apertou um dos olhos e disse para decepção da médica:
-- Na verdade é algo um pouco
mais sofisticado...
-- Oh... – Letícia suspirou
frustrada.
-- Ouvi o delegado falando do
restaurante italiano e... Achei que te devia uma refeição decente, já que te fiz
comer aquela gororoba em forma de hot dog...
Fernanda
disse acomodando as sacolas sobre a mesa de centro. Leticia se aproximou
retrucando:
-- Aquela gororoba como você
fala, foi uma das refeições mais saborosas que já fiz em toda minha vida.
Fernanda
sorriu sincera.
-- Duvido que essa sofisticação
do restaurante que o delegado sugeriu supere o dogão do Aguiar, mas, deve
servir para matar a fome, mais do que uma saladinha sem graça que você trouxe
de casa não é?
Leticia
sentou-se ao lado de Fernanda sorrindo.
-- Agente Garcia, você está me
acostumando mal...
-- Não se acostume! Não sou
sempre tão prestativa não...
Letícia
serviu-se da massa trazida por Fernanda.
-- Hum... Quatro queijos?
-- Não gosta? – Fernanda indagou
temerosa.
-- Imagina! Adoro! Sou uma
apaixonada por queijos e vinhos.
-- Bom saber...
Fernanda
deixou escapar, depois provou do seu prato. O molho ao sugo do macarrão
espalhou-se além do canto da boca da morena, e foi a vez de Leticia rir da
lambança feita pela policial.
-- Deixe-me limpar isso...
Com
delicadeza Leticia alcançou o guardanapo e limpou a boca de Fernanda. Os olhos
se encontraram naquele gesto, e pareceram se iluminar imediatamente. Durante
alguns segundos ficaram presas pelos olhos, sem conseguirem se desviar como se
estivessem inevitavelmente unidas por um campo magnético indestrutível.
-- Já está limpo... – Letícia
quase sussurrou.
-- Obrigada.
Fernanda
respondeu tímida. Conversaram amenidades durante o resto da refeição, trocando
olhares de encantamento.
-- Eu preciso ir, verificar
aquela lista de suspeitos...
-- Ah sim, claro. Não me esqueci
do que você me pediu, assim que descobrir algo te comunico.
-- Obrigada doutora.
-- Letícia.
-- Isso, doutora Letícia.
-- Não... Eu quis dizer que...
Basta me chamar de Letícia.
-- Ah! – Fernanda sorriu. – Tudo
bem Letícia.
As
duas sorriram.
-- Então, vou indo...
Fernanda
caminhou de costas em direção a porta, como se quisesse retardar o máximo o
final daquele encontro. Bateu as costas na maçaneta da porta, despertando um
riso discreto de Letícia.
**************
A
busca pelas amostras de DNA dos suspeitos começou bem mais difícil do que os
investigadores calculavam. Naquela tarde, Fernanda e Beto perseguiram no morro
da Mangueira um dos suspeitos que reagiu a abordagem dos policiais, uma vez que
era fichado por tráfico de drogas.
Fernanda
conseguiu prendê-lo, mas para isso, saltou de uma laje, e na queda sofreu além
muitas escoriações, um grande corte na testa. A policial chegou ao departamento
coberta de sangue, usando seu casaco para estancar o sangue no corte, enquanto
Beto arrastava o suspeito algemado.
-- Mas que diabos foi isso?
Garcia você está ferida?! Por que não está no hospital?! – Wellington perguntou
em tom de exortação.
-- Um arranhãozinho de nada
chefe, fica frio.
-- Você está banhada de sangue
Garcia! Vá cuidar desse corte agora!
-- Ow raça mole é homem viu! Não
pode ver um sanguezinho e fica aí dando xilique. Já disse não é nada demais, é
jogar uma água e colocar um band-aid e pronto!
-- Garcia sem papo! É uma ordem!
Não quero processo disciplinar contra mim depois!
-- Eu tenho um preso para
interrogar!
-- Não, você tem uma cabeça pra
costurar! O Beto cuida do preso!
A
discussão do delegado com Fernanda só cessou com a chegada de Leticia.
-- Fernanda! O que houve? Você
foi ferida?! – A médica perguntou angustiada.
-- Só um cortezinho de nada
doutora, nada demais.
-- Deixe-me ver isso... Ups...
Isso precisa ser suturado... Vamos, vamos para o laboratório, tenho material
lá, vamos dar um jeito nisso.
-- Não é necessário...
-- Garcia!
Wellington
bradou. Como criança contrariada, Fernanda bateu os pés e saiu irritada em
direção ao elevador, sendo seguida por Letícia.
********
-- Nossa, isso está feio... De
que altura você caiu?
-- Ah foi de uma laje, sei lá,
uns quatro metros... Nada demais... Aii!
-- Desculpe, mas tenho que limpar
primeiro...
Fernanda
fazia caretas de dor e gemia a cada vez que Leticia passava a compressa de gaze
pelos ferimentos. A médica se aproximou com uma seringa para a surpresa e pavor
da policial que saltou do banco imediatamente.
-- Ei! O que é isso aí? Injeção?!
Não mesmo! Tô fora!
-- Mas... Fernanda eu preciso
anestesiar você! Ou você prefere que eu costure sua testa sem anestesia?
-- E por que precisa usar
anestesia assim numa injeção?! Use uma pomadinha!
Fernanda
se esquivava, enquanto Leticia sorria incrédula.
-- Pomadinha? Eu preciso suturar
várias camadas da sua pele, uma pomadinha não ia adiantar nada. Eu não estou
acreditando nisso. Uma mulher desse tamanho, que se joga de uma laje pra
prender bandido está com medo de uma agulhinha!
-- Agulhinha nada! Olha o tamanho
aí! Isso dá pra perfurar um cérebro!
-- Agente Garcia não me faça
correr atrás de você!
Letícia
mudou o tom de voz franzindo o cenho, mas isso só amedrontou ainda mais
Fernanda que correu, mas foi barrada por Gisele que entrava no laboratório.
-- Opa! Está com pressa Nanda?
-- Segura ela!
Leticia
berrou segurando a seringa.
-- Ow ow... Eu já vi essa cena...
Fernanda correndo, uma seringa atrás...
Gisele
deixou escapar sem dar espaço para Fernanda passar.
-- Sai da frente Gisele! –
Fernanda tentava empurrar a amiga.
-- O que está acontecendo
doutora? Isso é sangue na sua roupa Nanda?!
-- Estou tentando dar uns pontos
nesse corte aí, mas ela correu quando viu a agulha da anestesia!
-- Fernanda Garcia! Tenha
vergonha! – Gisele exortou.
-- Sai da frente Gisele, ou eu te
derrubo!
Fernanda
falou grosso, quando finalmente conseguiu empurrar Gisele e correr, tropeçou no
pé de Dulce que estava à espreita quando percebeu a movimentação levando
Fernanda ao chão. Imediatamente rendeu a policial aplicando uma chave de braço
e disse:
-- Vai doutora, aplica logo!
Um
tanto quanto assustada, Leticia aplicou a anestesia no local da sutura sob os
protestos de Fernanda.
-- Dulce você me paga essa!
-- Você me ameaça desde a segunda
série! Mas sempre deu certo meu golpe! Em todas as campanhas de vacinação! Sou
pequena, mas tenho braços fortes...
Dulce
se vangloriou exibindo seus pequenos bíceps, enquanto Leticia ajudava Fernanda
a se sentar na poltrona.
-- Você é muito forte e
habilidosa mesmo Dulce, surpreendente... – Letícia comentou.
-- Posso surpreender muito mais
doutora...
Dulce
fez charme, enquanto Fernanda praticamente rosnou para a jornalista com o
olhar. Nervosa com o tom de flerte de Dulce, Leticia espetou a agulha em um
ponto não anestesiado.
-- Ai doutora! – Fernanda
reclamou- Posso saber o que vocês duas estão fazendo aqui? – Fernanda indagou.
-- Viemos falar com você.
Pensamos em algo que pode ajudar no caso. – Gisele respondeu.
-- O que? Fala Gisele!
-- Percebemos que o assassino tem
seguido o padrão de tempo de uma vítima para outra. Da primeira para a segunda
vítima foram dez dias. Já se passou uma semana da morte da segunda vítima, isso
nos leva a supor que ele está se preparando para o terceiro crime que deve
ocorrer daqui a três semanas. – Dulce resumiu.
-- Se esse doido está imitando
seu livro, temos três semanas para encontra-lo, legal, mas isso não nos ajuda
muito. Ai Leticia! – Fernanda gemeu.
-- Desculpe-me. – Leticia fez uma
carinha de culpa.
-- Nanda pode ajudar, se
considerarmos que ele utilizará o mesmo método para matar a terceira vítima. –
Gisele completou.
-- Então nós temos que torcer
para ele seguir o padrão do livro, esperar ele fazer uma terceira vítima?-
Fernanda ironizou.
-- Você precisa ler meu livro
Nanda... Claro que não estou falando de esperar passivamente a morte de outra
mulher! Mas, se sabemos como ele vai matar, sabemos que ele está se preparando,
sabemos que arma ele vai usar, que cenário ele vai precisar para imitar o
livro. – Gisele explicou.
-- Continue...
Fernanda
escutava atenta, enquanto Leticia continuava a suturar sua testa.
-- No meu livro, a terceira
vítima foi afogada na banheira de um motel.
-- Ah ótimo! Quase não temos
motel no Rio de Janeiro, vai ser fácil... No dia 14 do próximo mês montamos
guarda em todos os quartos com banheira dos motéis do estado. – Fernanda foi
sarcástica.
-- Até agora vocês não atentaram
para um detalhe... – Dulce interrompeu – As drogas que ele utiliza para dopar
as vítimas são de uso restrito, controlado. Podem investigar os meios lícitos
para consegui-las, quem as comprou no último mês, ou se algum funcionário que
tem acesso a essas drogas se encaixa no perfil que vocês já tem.
-- Isso é como procurar agulha no
palheiro... Não é uma droga tão incomum, em qualquer posto de saúde ou hospital
pode ser encontrada, pelo menos o diazepan injetável sim. – Letícia comentou.
-- É outro caminho que podemos
seguir doutora. Não vai ser difícil identificar se algum funcionário de
hospital ou unidade de saúde tem esse tipo de deficiência na mão. Quem sabe
tenhamos sorte. – Fernanda disse.
-- Acho que nós quatro formamos
uma boa equipe. Pensamos bem juntas – Dulce comentou.
Leticia
balançou a cabeça positivamente concluindo o curativo em Fernanda.
-- Acho que somos mesmo sinônimo
de perigo e confusão!
Fernanda
disse se levantando.
-- Bonitas e perigosas,
combinação perfeita.
Gisele
disse arrancando um sorriso das demais.
terça-feira, 17 de julho de 2012
Beautiful Dangerous - Terceiro Episódio
EPISÓDIO 3 – PERTO DEMAIS
Fernanda
chegou ao local acompanhada de Leticia. Um velho galpão na Zona Leopoldina, próxima
a antiga estação do mesmo nome.
De
longe Beto acenou para a colega, o local já estava cercado de outros policiais
e peritos.
-- Outra menina, mulher branca,
28 anos, foi encontrada por pedintes, garantem que ela estava sem bolsa ou
qualquer outro pertence, ou seja, não sabemos quem ela é. – Beto resumiu.
Fernanda
se aproximou do corpo junto com Leticia, arregalou os olhos e com a voz trêmula
disse:
-- Nós sabemos sim, eu a conheço.
-- Você a conhece? – Beto indagou
surpreso.
-- Conheço, quer dizer, conhecia.
Nara Medeiros, ela trabalhava em uma multinacional, era gerente de RH. Voltou
ao Rio há três dias. Estive com ela ontem. Meu Deus...
Os
policiais se encararam, Leticia fez os primeiros exames no corpo ali mesmo,
supondo a causa da morte.
-- Aparentemente ela foi
estrangulada. As marcas do pescoço indicam que foi utilizado um fio com
diâmetro pequeno. Ela não lutou, o que me faz acreditar que a exemplo da outra
vítima, ela foi dopada para ser trazida para cá, a marca da seringa reforça
minha suspeita, exatamente no livro de Catherine Morgan, a segunda vítima foi
vítima de estrangulamento. – Leticia explanou.
Nitidamente
abalada, Fernanda acariciava o rosto da vítima, quando a médica disse:
-- Ela era muito bonita.
Fernanda
acenou em acordo.
-- Encontraram mais alguma pista
aqui Beto? – Fernanda perguntou.
-- Temos alguns rastros, marcas
de solado de calçado na lama. Mas isso não nos ajudará, muitos pedintes
passaram por aqui. – Beto respondeu.
-- Nenhum deles viu nada? –
Fernanda insistiu.
-- Se viram negaram. – Beto respondeu. - O rabecão chegou.
-- Doutora, a senhora se incomoda
se eu assistir a autópsia do corpo? – Fernanda indagou.
-- Tem certeza que você terá
estrutura para isso? Não é nada agradável, especialmente você a conhecendo. –
Letícia interrogou complacente.
-- Eu quero e preciso, não quero
deixar que nenhum detalhe escape, eu quero pegar esse louco assassino o mais
rápido possível.
Letícia
balançou a cabeça positivamente concordando com o pedido da policial.
-- Vamos começar hoje mesmo
então.
Saíram
juntas, logo após o corpo ser removido.
-- Preciso avisar a família dela,
tenho que fazer isso pessoalmente. Incomoda-se de ir com o Beto para a
delegacia doutora Letícia?
-- Claro que não investigadora
Garcia.
Antes
de deixar o local, Fernanda avisou um movimento suspeito por trás de uma das
colunas do galpão. Andou apressada nessa direção, surpreendendo Dulce que
inutilmente tentava se esquivar.
-- Dulce?! Porra de novo?!
Fernanda
puxou a amiga pela jaqueta.
-- Qual seu problema?! Acaso está
trabalhando de agente funerário? Agora vive cercando cena de homicídio?! –
Fernanda berrava indignada.
-- Calma aí Nanda... Estou
precisando trabalhar! Pow eu fui demitida, preciso de boas reportagens “freela”
pra pagar minhas contas! Segui você quando falou de outra vítima do assassino
do livro.
-- Ainda não sabemos se é o mesmo
assassino. – Fernanda disse irritada.
-- Tinha que ser a primeira
noticiar isso, tem um louco caçando mulheres por aí, eu fui a primeira a
noticiar isso, quero continuar acompanhando esse caso, facilita aí Nanda...
-- Você é doida! Não quero
apavorar a população, tudo que menos preciso é uma repórter intrometida fazendo
sensacionalismo.
-- Uma repórter que tem uma
testemunha te interessa?
-- Testemunha? Não foi encontrada
nenhuma testemunha...
-- A policia não encontrou, mas
eu sim.
-- Desembucha Dulce!
-- Em troca eu ganho cobertura
exclusiva?!
-- Em troca eu não te prendo!
-- Se você me prender não falo o
que descobri com a testemunha...
Fernanda
encarou Dulce furiosa.
-- Dulce não me provoca...
-- É pegar ou largar.
-- Tá! Desembucha sua mala!
-- Um dos mendigos viu um homem
sair daqui acerca de duas horas.
-- Ele tem alguma descrição desse
homem?
-- Nada muito específico, exceto
que o homem tinha uma mão seca. Não entendi o que ele quis dizer com mão seca,
ele só explicou que o homem tinha uma mão esquisita, com os dedos tortos.
-- O Capitão Gancho...
**************
Fernanda
chegou ao laboratório de necropsia nitidamente abalada. O rosto denunciava que
chorara há pouco tempo. Letícia não notou sua chegada até a policial quase
derrubar a bandeja de instrumental da pericia, ao ficar tonta diante do corpo
aberto da vítima.
-- Investigadora Garcia?! Você
está bem?
Leticia
perguntou se aproximando de Fernanda que se apoiava em um balcão.
-- Estou é que...
Fernanda
continuava tonta, desviou o olhar do corpo exposto. Leticia se aproximou mais e
a policial se afastou com cara de nojo. A médica franziu o cenho estranhando a
reação da morena que apontou para as luvas de Leticia sujas de sangue.
-- Oh! Desculpe-me. – Leticia
retirou as luvas.
-- Tudo bem, você está
trabalhando, eu não quero atrapalhar...
-- Você está pálida, vamos para
minha sala, beber uma água, sentar-se um pouco, vai te fazer bem.
Fernanda
assentiu. Em sua sala, Leticia serviu um copo de água para a policial que
permanecia com um olhar triste, abalado, encarando o chão.
-- Ainda não consigo acreditar
que ela está morta. Eu sempre tive medo que na minha profissão um dia isso
acontecesse: investigar o assassinato de alguém que eu amei.
-- Vocês eram muito amigas? –
Leticia perguntou se sentando ao lado da policial.
-- Sim... Éramos muito intimas.
Fernanda
pausava procurando as melhores palavras.
-- Eu sinto muito.
Letícia
segurou a mão de Fernanda suavemente. A policial sentiu seu corpo estremecer
com aquele gesto delicado. Fernanda correspondeu a manifestação gentil da
legista com um sorriso discreto e um olhar desarmado.
-- Obrigada doutora.
-- Tem certeza que ainda quer
assistir a autópsia?
-- Realmente não é um bom
programa para essa hora da noite.
Fernanda
brincou tentando minimizar o clima triste.
-- Vou tentar agilizar o máximo
que puder a conclusão, e mantenho você informada, te prometo.
-- Não vou deixar você sozinha
aqui a essa hora da noite com um cadáver, pela sua boa vontade de colaborar
com sua competência e rapidez, vou te fazer companhia e providenciar algo para
comermos.
-- Não precisa se preocupar
agente Garcia. Não estou com fome.
-- Doutora eu sei que seu
trabalho tira o apetite, eu até agora estou com o estômago meio embrulhado, mas
imagino que a senhora precise comer uma hora. Estou com você desde a hora do
almoço, nem eu, nem você comemos nada, deixe eu te trazer ao menos um
sanduíche...
-- Mas...
-- Ah doutora! A senhora come não
é? Você tem cara de só comer folha e vento, posso trazer um “cheese salada”.
Leticia
sorriu e acenou em acordo.
-- Então segura as pontas aí que
vou providenciar nossa bóia.
**********
Fernanda
voltava para a delegacia com sacolas na mão quando Carol a encontrou no
corredor que dava acesso ao laboratório de necropsia onde Leticia estava.
-- Nanda! Eu fiquei sabendo
agora! É verdade sobre a segunda vítima do Capitão Gancho? Era a Nara?
-- Era sim Carol.
-- Meu Deus! Que coisa horrível!
Como você está amiga?
-- Chocada Carol. A Nara estava
tão bem, cheia de planos, acabou de ser promovida na empresa, você sabe como
ela dava o sangue pela carreira dela, a ponto de sacrificar até nosso
relacionamento... Quando a vi ali estendida...
Fernanda
pausou com sua voz travada. Carol a abraçou.
-- O que você está fazendo aqui?
Por que não vai para casa?
-- Estou aqui para ajudar a
doutora na autópsia, quero saber de qualquer coisa que me leve a esse monstro!
-- Nanda eu não acredito nisso!
Você quer ver o corpo de sua ex-namorada ser remexido, cortado, está louca?!
-- Shi... Fala baixo! Quer que
todos saibam que a segunda vítima de um serial killer já foi minha namorada? Era
tudo que o pulha do Wellington precisa pra me tirar do caso!
-- Nanda você não precisa passar
por isso...
-- Eu não preciso, mas quero,
devo isso a Nara.
Da
sua sala, Leticia escutou sem querer a conversa das policiais. Carol olhou para
as sacolas nas mãos de Fernanda e indagou curiosa.
-- O que são essas sacolas?
-- Jantar para mim e para
doutora.
-- Dogão do Aguiar? Você trouxe
um dogão do trailer da esquina para a mulher que usar Dior e Gucci para
trabalhar?!
-- O que é que tem? É o melhor
cachorro quente do bairro!
-- Nanda você não existe...
Fernanda
deu de ombros e entrou na sala da legista.
-- Nosso jantar doutora.
Fernanda
sentou-se no sofá, e foi tirando os embrulhos da sacola, dispondo na mesa de
centro.
-- Eu não sabia do que você
gostava então pedi um completo.
Leticia
sentou-se vizinho a policial no sofá, olhando com estranheza o tamanho e a
forma do sanduíche. O amontoado de ingredientes coloridos empilhado sobre uma
baguete gigantesca.
-- Salsichão, carne moída, purê
de batatas, milho verde, cenoura ralada, azeitona fatiada, batata palha, molho
e mostarda.
Fernanda
listou, entregando o hot dog para a médica. Leticia encarou o sanduíche se
questionando mentalmente como comeria tamanha “iguaria”, duvidava que coubesse
em sua boca aquela montanha de ingredientes. Enquanto pensava, Fernanda mordeu
o cachorro quente deixando escapar pelo canto da boca molho e as sobras que
obviamente não cabiam numa só mordida.
-- Delícia! Não vai provar o seu?
Sem
cerimônia, limpando a boca Fernanda disse com a boca cheia. Desajeitada,
Letícia se preparou para morder o sanduiche da melhor forma, mas, conseguiu se
sujar mais do que Fernanda, sujando além da boca, o queixo e o nariz. Fernanda
não se conteve, vendo o rosto da médica pintado do amarelo da mostarda,
vermelho do molho de tomate e branco do purê, sorriu divertida.
-- Oh... Isso é mesmo delicioso.
Nunca comi nada parecido.
Leticia
notou os risos de Fernanda e perguntou depois de morder mais uma vez o cachorro
quente:
-- O que foi? Do que você está
rindo investigadora?
-- Nada não... É que você está
parecendo o Ronald McDonald...
Leticia
parou de mastigar imediatamente, sem graça pegou um dos guardanapos e limpou a
boca.
-- Não é só sua boca que está
suja... – Fernanda disse sorrindo.
-- Não?!
Fernanda
balançou a cabeça negativamente, e a limpou ela mesma o rosto de Leticia
delicadamente. Os olhos se cruzaram por segundos. A atração desconhecida que
mantinha aqueles olhares unidos era tão forte que fez Leticia recuar, a ruiva
desviou o olhar perguntando:
-- Limpou tudo?
Fernanda
baixou os olhos depois de acenar em acordo.
-- A mulher do Dior já provou esse cachorro quente?
Letícia perguntou inocentemente. Fernanda sorriu.
-- Isso não está registrado na biografia dele com certeza...Mas, não deixa de ser uma possibilidade.
-- Mas nem sei se ele foi casado...
Quando
Leticia começava a argumentar Fernanda sorriu mais uma vez balançando a cabeça
negativamente.
-- Ah... Você não estava se
referindo ao estilista Dior não é?
-- Não, falava do vestido que
você usava quando nos conhecemos...
Letícia
sorriu tímida.
-- Aquela mancha saiu? Ou te devo
alguns meses de salário por um vestido novo? – Fernanda perguntou.
-- Saiu sim, não precisa se
preocupar. E sobre sua impressão de quão improvável seria eu comer um cachorro
quente pitoresco da rua, bem, confesso que nunca fui adepta dessa culinária,
mas a julgar por esse sabor...
-- Descobriu que perdeu muito
tempo da sua vida comendo folha e vento com azeite né?
Leticia
acenou em acordo com a boca cheia.
-- Hurrum.
Fernanda
sorriu mais uma vez, mas agora, com encantamento encarando a legista.
********
Leticia
prosseguiu com a necropsia, tendo Fernanda como espectadora. Gravou no seu mp3
o que via, em detalhes: as marcas e hematomas, as escoriações, tudo corroborava
para a tese de que se tratava do mesmo assassino.
-- Ela também foi arrastada? –
Fernanda quis saber.
-- Sim, mas, por uma distância
pequena.
-- Algum palpite sobre arma do
crime? – Fernanda perguntou.
-- Isso é curioso. Nesse ponto, o
assassino fugiu do padrão do livro.
-- Como assim?
-- No livro o assassino usa um
fio de nylon para estrangular a vítima, mas nesse caso, o fio não era desse
material. Vê essas marcas aqui? Foram pequenos cortes, encontrei resquícios de
uma espécie de pó cortante. Isso é compreensível porque ele não teria forças
para estrangulá-la devido a sua lesão.
-- Cerol? O cara usou uma linha
com cerol?
-- Cerol?
-- É uma mistura com pó de vidro
que os irresponsáveis que usam nas linhas das rabiolas...
-- Rabiolas?
-- Pipas, conhece?
-- Ah!
-- Então, essa mistura corta a
linha das outras empinadas...
-- Entendi. Então, o assassino usou
cerol na linha que estrangulou a vítima. Certamente usou uma luva resistente
para não se cortar.
-- Doutora esse monstro não
deixou um vestígio na roupa, no corpo dela? Algo que nos leve a identidade
dele?
-- Hum... Não quero te dar falsas
esperanças, mas encontrei na pulseira do relógio da vítima fragmentos de
células da pele, se tivermos sorte, essa pele não é dela.
-- Pode ser do assassino não é? O
relógio pode ter arranhado o assassino enquanto ele a arrastava não é isso?
-- Exatamente investigadora!
-- E o resultado daquela ponta de
cigarro que a Gisele me entregou?
-- Amanhã teremos o resultado.
-- Então amanhã é o dia que
avançaremos nessa investigação finalmente.
-- Vou terminar a autópsia para
liberar o corpo. – Leticia disse.
*************
Fernanda
chegou nitidamente abalada ao departamento. Cumprimentou rapidamente os colegas
e subiu para o laboratório onde Leticia estava analisando lâminas no
microscópio.
-- Investigadora Garcia! Estava
mesmo querendo falar com você... Mas, o que houve? Você não me parece bem.
-- Estou chegando do sepultamento
da Nara.
-- Oh...
-- Doutora eu preciso de boas
notícias! Por favor, me diga que você tem boas notícias!
-- Acho que as tenho. Conseguimos
extrair o DNA da ponta de cigarro e das células epiteliais presas no relógio da
segunda vítima, e se tratam da mesma pessoa.
-- Yes!
-- E não é só isso... Agora temos
a idade aproximada do assassino, quero dizer, do suspeito, o que vai nos ajudar
a filtrar os resultados do SINAN, amanhã nós teremos um relatório com os casos
notificados de hanseníase com grau de incapacidade, tendo a faixa etária, nos
dará uma margem para filtrarmos os resultados.
-- E aí colhemos amostras para
comparar com o DNA que temos e...
-- Pegamos o Capitão Gancho! – Leticia
falou empolgada.
Foi
inevitável para Fernanda não sorrir com a reação da médica.
-- Não temos motivo para
comemorar?
Leticia
indagou sem jeito.
-- Acho que devemos comemorar
quando prendermos esse monstro.
Leticia
acenou em acordo, afastou-se da bancada do microscópio e no trajeto até um dos
armários, tropeçou, sendo amparada por Fernanda. Ficaram tão próximas, que
podiam sentir a respiração uma da outra. Tão perto uma da outra não havia como
fugir daqueles olhares cheios de uma atração tão intensa que chegavam a
confundi-las.
O
contato que não demorou mais do que segundos, mas estes foram suficientes para
acender em ambas um turbilhão de sensações inéditas. No entanto, aquele clima
foi devidamente interrompido, pela chegada de Wellington.
-- Doutora Letícia? O que está
acontecendo aqui Garcia?!
-- Ow... Delegado... A doutora ia caindo e... Eu só segurei...
Fernanda
se atrapalhou para explicar, se apoiou na mesa que abrigava um cadáver.
-- Aiii!
A
policial sacudiu a mão apavorada. Letícia segurou o riso e Wellington mudou de
assunto.
-- Eu só passei aqui para saber
dos avanços da investigação...
-- Ah! Sim, avançamos bastante,
já temos amostras de DNA para comparar com uma lista de possíveis suspeitos que
teremos amanhã. - Leticia informou empolgada.
-- Ótimo doutora! Sabia que a sua
competência e inteligência extraordinárias, era o que precisávamos para colocar
esse departamento no time dos melhores!
Fernanda
fez careta de nojo ao ouvir a rasgação de seda do chefe.
-- Obrigada delegado, mas o
sucesso do meu trabalho só é possível quando trabalho com os melhores
investigadores, e o senhor tem isso no seu departamento.
Wellington
não deu importância a observação da legista.
-- Bom, eu vim também para
confirmar nosso encontro de mais tarde. Tudo certo para nosso happy hour
doutora?
--Er... Ah, eu... – Leticia
gaguejava desconcertada olhando para Fernanda.
-- Não vá me dizer que se
esqueceu doutora! – Wellington disse franzindo o cenho.
-- Não, é que estou com tanto
trabalho...
Fernanda
mantinha os olhos baixos, brincando com uma liga de elástico.
-- Doutora Leticia, hoje é
sexta-feira, foi uma semana muito cansativa, vamos lá, relaxar um pouco. Não
aceito um não como resposta!
Leticia
tentou argumentar, mas foi inútil. Wellington encerrou o assunto avisando:
-- Espero você em meia hora. Ah!
Garcia, a dona Gisele da Silva acabou de depor, quer falar com você. Você
aprontou algo com ela? Garcia ela é sobrinha do secretario de segurança do
estado, não faça besteira!
-- Não torra Wellington! Vá lá
pro seu happy hour – Fernanda fez um gesto caricato – E me deixa em paz!
Fernanda
saiu irritada do laboratório e encontrou Gisele assinando o seu depoimento com
Carol.
-- Gi? Queria falar comigo?
-- Oi Nanda!
-- O delegado disse que você
queria falar comigo. Aconteceu alguma coisa?
-- Será que tem um lugar que
possamos conversar a sós?
-- Claro. Carol a sala de
reuniões está desocupada?
-- Sim, está. – A escrivã
respondeu.
Gisele
dispensou seu advogado e seguiu Fernanda até a sala de reuniões.
-- E então? Aconteceu algo? –
Fernanda indagou preocupada.
-- Nanda, eu não tenho dormido
desde o assassinato em Itatiaia. Tenho pesadelos todos os dias com aquela moça.
Eu me sinto tão culpada Nanda...
-- Ei! Para com isso Gi! Você não
tem culpa de nada! O cara é um louco! Você poderia estar morta também!
-- Mas ele está se inspirando nos
meus livros Nanda!
-- Gisele tem maluco de todo
jeito nesse mundo! Se você soubesse o tanto de doido que já prendi! Eles nem
precisam de inspiração não, acredite!
-- Nanda, eu preciso fazer algo
para ajudar a prender esse assassino. É minha obrigação!
-- Gisele você já está fazendo.
Tem colaborado incondicionalmente nas investigações.
-- Nanda, eu quero e posso fazer
mais. Eu escrevi aqueles livros, eu sei criei aqueles assassinatos, eu posso
ajudar a esclarecer, analisar a personalidade do assassino.
-- Uma espécie de consultoria?
-- Chame como quiser, só me deixa
ajudar em algo Nanda, eu preciso disso.
-- Tudo bem Gi. Fique tranquila,
vou ter que comunicar ao delegado, e outra condição: não quero que você se
exponha, nem se arrisque ok? Esse assassino te conhece, e se ele for um fã
maluco seu... Enfim, você promete que vai me obedecer?
-- Ok, eu prometo.
Fernanda
sorriu segurando o braço da amiga que correspondeu ao sorriso. Saíram da sala e
avistaram Wellington e Letícia saindo em direção ao elevador. O delegado com a
mão na cintura da legista visivelmente constrangida.
-- Aquela dali não é a doutora
gracinha que estava com você em Itatiaia?
-- É.
Fernanda
disse aborrecida. Carol se aproximava olhando da mesma direção.
-- Quem diria que o delegado ia
partir na frente... – Carol comentou.
-- Que pena a ruiva gata não
jogar no mesmo time que eu... – Gisele lamentou.
Fernanda
acompanhou com o olhar o delegado e Leticia esperando o elevador e antes de
entrar, a médica encontrou os olhos atentos da policial. Fernanda desviou o
olhar com um convite inusitado:
-- Gisele, você quer sair pra
beber alguma coisa comigo?
--Eu?!
-- Tem outra Gisele aqui?
Carol
apertou os olhos lendo intenções da amiga.
-- Opa! Vamos lá! – Gisele aceitou animada.
********
Fernanda
levou Gisele a um barzinho na orla da praia de Copacabana. Lá, as amigas de
infância relembraram suas histórias, riram com as lembranças confusas,
principalmente as armações delas no colégio de freiras.
-- A irmã Conceição caía
direitinho nessa sua cara de santa oriental! – Fernanda disse depois de
gargalhar.
-- Não tenho culpa da minha
carinha de anjo. Além do mais, alguma de nós tinha que ter alguma
credibilidade. A Dulce era uma mentirosa compulsiva, toda semana ela matava uma
tia pra justificar os atrasos dela nas aulas de educação física.
-- Morta de preguiça de acordar
mais cedo isso sim! Isso quando ela não fingia uma crise de asma pra não correr
em volta da quadra...
As
duas gargalharam de novo relembrando.
-- E você Nanda, era a rainha das
peças. E era também a mais sortuda! Nunca foi pega! Você passou pó de mico no
terço da Irmã Paulina antes da prova final de matemática! A coitada ficou toda
empolada, só conseguiu voltar às aulas uma semana depois!
-- Ah eu não sabia que ela era
alérgica pow! Só queria desconcentrá-la pra gente colar com mais calma... –
Fernanda tentou se justificar.
-- Você quase mata a velha isso
sim!
Riram
de novo e beberam mais uma tulipa de chopp. A vigésima da tarde que já virara
noite. Quando deram por si, já nem sabiam mais contar quantos chopps haviam
tomado. Estando mais perto do flat de Gisele, tomaram um táxi e seguiram para
lá.
-- Caraca Gi fazia muito tempo
que eu não bebia assim...
Fernanda
falava com a voz pesada, entre risos, jogada no sofá.
-- Vem dançar comigo Nanda? Você
ainda se lembra da nossa coreografia do final de ano de Lua de Cristal?
-- Caracaaaa!
Fernanda
foi arrastada pela amiga e com dificuldade se equilibrou para acompanhar Gisele
na letra e na coreografia.
--“ Tudo pode ser, se quiser
seráaaa sonhos sempre vem pá quem sonhaaar, tudo pode ser só basta sonhar, tudo
que quiser pra ser lutarrrrr”
Gisele
errava a letra da música fazendo movimentos hilários com as mãos, sendo imitada
por Fernanda que mais ria do que dançava.
--“Vamos com você nós somos
invisíveis pode crer! Todos somos um e tudo não existe só mais ummm... Lua de
cristal que me faz chorar cai a minha estrela que eu já sei pulaaaar”
Fernanda
pulou como a nova versão da música cantada por Gisele pedia, mas o salto duplo
twist carpado da policial acertou em cheio a coreógrafa e as duas caíram juntas
no chão.
-- Não me lembro dessa parte da
coreografia... – Gisele deixou escapar.
-- Se tivesse essa parte, garanto
que nosso sucesso estava garantido, pelo menos dariam risada da nossa queda e
não da sua fantasia mijada!
Gisele
fez bico, segurando o choro, como fazia quando criança. Fernanda retrucou:
-- Ah não Gi! Engole esse choro!
-- Por que você tinha que falar
nisso agora?!
Gisele
falou chorando aos soluços.
-- Tudo bem, chora, mas não molhe
as calças!
O
berreiro de Gisele foi maior, Fernanda só conseguia rir, até que os risos
contagiaram a amiga chorona que intercalava choro e gargalhada.
-- Como eu vivi tanto tempo sem
você?!
Gisele
disse encarando a policial.
-- Deixe-me ver... Tendo uma
carreira de sucesso como a maior autora de romances policiais da atualidade,
ficando fica e ainda mais linda... Acho que você se saiu bem sem mim todo esse
tempo sim.
Fernanda
disse afastando uma mecha de cabelo do rosto da escritora.
-- Eu senti sua falta Nanda,
pensava em você sempre.
-- Eu também Gi, afinal a gente
nunca esquece o primeiro beijo não é?
-- Pelo menos não o primeiro
beijo em uma mulher...
Gisele
disse mordendo os lábios. Fernanda olhou para a boca da escritora e não
resistiu, puxou o rosto de Gisele para um beijo lânguido. Sobre o corpo de
Fernanda, Gisele encaixou os joelhos na cintura da policial, investindo em
outro beijo igualmente voluptuoso, enquanto a morena arrancava as roupas da
escritora.
Sem
as roupas, Gisele ofereceu seus mamilos eriçados à boca de Fernanda, que em
pouco tempo depois de lamber com voracidade o que era ofertado, sentiu o peso
do corpo de Gisele sobre o seu.
-- Gi, você continua deliciosa...
– Fernanda sussurrou ofegante.
-- Hurrum...
O
murmúrio de Gisele excitou ainda mais Fernanda que insistiu enquanto suas mãos
passeavam pelas costas e bumbum da escritora:
-- Quero seu corpo todo nu sobre
o meu, sentir você inteira Gisele...
Fernanda
não teve a resposta esperada. O que ouviu foi um sonoro:
-- Roooonc...
-- Não acredito! Puta que pariu!
Gisele!
Não
adiantou o brado. Gisele roncava, em um sono profundo, tão profundo que não se
incomodou ao ser jogada ao chão por Fernanda, que a deixou dormir no chão e
tomou posse da cama espaçosa sozinha, como se aquilo representasse alguma
vingança pelo tesão naufragado naquela noite.
************
O
barulho da campainha acordou Gisele como se fosse uma buzina de um
transatlântico.
-- Calma aí! Já vai!
Do
jeito que estava só de lingerie Gisele se levantou, envolveu-se na camisa de
Fernanda sobre uma cadeira e abriu a porta.
-- Dulcinha?!
-- Oi amiga, desculpa te acordar
assim, mas é uma emergência. Nossa, que trajes são esses Gi? Ai meu Deus! Estou
interrompendo algo?!
Sem
cerimônia, Dulce foi entrando no flat com suas malas olhando em volta,
analisando a bagunça instalada.
-- Dulcinha que emergência? O que
aconteceu? E o que são essas malas? Você está fugindo de alguém?!
-- Mais ou menos... Fui despejada
amiga, preciso de um abrigo.
-- Han?!
Enquanto
Gisele se dava conta da surpresa que Dulce lhe preparara, Fernanda aparecia na
sala com sua típica calcinha box e top.
-- Nanda?! Ai meu Deus! Vocês?!
Nãaaaao?! Juraaa?
Dulce
abria e fechava a boca com os olhos arregalados.
-- Nãao. Não né?
Gisele
perdida olhava para Fernanda em busca de respostas. Com um tom de irritação a
morena respondeu:
-- Não Gisele. O que é que essa
doida está fazendo aqui essa hora?
-- Está quase na hora do almoço
tá! Estou aqui por que não podia contar com mais ninguém! Fui demitida, sem
emprego, o dono do meu apartamento não renovou meu contrato, me despejou, e não
tenho grana pra ir pra hotel. – Dulce explicou.
-- E sua família Dulce? Sabe que
era uma coisa que eu queria te perguntar mesmo... Como você vive nessa pindaíba
com o dinheiro que sua família tinha? – Gisele interrogou.
-- Você disse quase hora de
almoço?! Droga! Estou atrasada, tenho que encontrar a doutora Letícia! –
Fernanda disse procurando suas roupas.
-- Minha família continua cheia
da grana, mas não quero pedir dinheiro ao meu pai. – Dulce foi evasiva.
-- E sua mãe? – Gisele insistiu.
-- Minha mãe é uma alienada que
torra o dinheiro do divórcio com uns boyzinhos mais novos que eu, nem sei onde
ela está morando agora.
-- Mas Dulce, seu pai tem
obrigações com você, é hora de deixar esse orgulho pra trás e pedir ajuda...
-- Olha aqui Gisele, se você não
puder me ajudar fala tá? Eu vou pra debaixo da ponte, mas não procuro meu pai!
– Dulce interrompeu.
-- Sempre dramática... Devia ter
aproveitado esse talento nato para o teatro, você escolheu a carreira errada...
Fernanda
disse chegando à sala já vestida.
-- Tudo bem Dulcinha, pode ficar.
Mas isso aqui é um flat, não tem muito espaço, vai ter que dormir no sofá
quando eu estiver aqui.
-- Claro Gi! Não se preocupe,
você nem vai notar minha presença aqui.
-- Sei... Espaçosa do jeito que
você é Dulce, até na casa da Gisele em Itatiaia faltaria espaço para ela mesma!
Fernanda
disse, em resposta Dulce lhe mostrou a língua, despertando o riso da policial.
-- Gi, eu estou indo, mantenho
você informada. E cuidado com essa daí viu, reviste-a, procure por alguma
câmera escondida nela...
Dessa
vez Dulce atirou uma almofada contra a policial que escapou mostrando a língua.
-- E então amiga, vamos pedir
almoço?! Ouvi falar que o restaurante daqui é maravilhoso!
Gisele
suspirou pressentindo que sua paz estava seriamente ameaçada pelo presente de
grego que acabara de receber.
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