quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

LEIS DO DESTINO: 9º CAPÍTULO

CAPÍTULO 9 - Culpa in comitendo

Culpa em cometer, agir por imprudência. É a culpa que surge em decorrência da prática de um ato que causa prejuízo. Quando não cuida de algo que pode vir atingir a terceiros ou a própria pessoa.

Por Têmis

                Diana ficou de pé num movimento só. Caminhou em direção à mulher que fulminava Natália com os olhos, com a desculpa mais clichê de todos os tempos:

-- Não é nada disso que você está pensando!

                Natália completamente perdida na situação formulou mil hipóteses sobre quem seria aquela mulher alta, de cabelos ruivos curtos e desfiados, olhos negros, poderia ser alguma tia de Diana, afinal era muito jovem para ser sua mãe, mas velha demais para ser sua irmã.

-- Não insulte minha inteligência Diana! Não estou pensando nada! Eu vi!

-- Mas... Não significa nada...

                Diana parou a justificativa se enrolando com as palavras, sem saber ao certo as conseqüências delas naquele momento.

-- Eu antecipo minha volta por estar preocupada com você que não me dá notícias desde ontem, e olha o que recebo de surpresa! Um belo par de chifres!

                Natalia arregalou os olhos e se sentiu a última das mulheres. Enquanto Diana tentava em vão acalmar a ira da sua suposta namorada.

-- Meu amor, eu posso explicar...

-- Explicar? Diana faça-me o favor! Até demorou pra você procurar uma menininha da sua idade, mas não esperava que você fosse tão vil, trazer outra mulher para dentro da casa que você me chamou para dividir semanas atrás! Como você pode?

                Natalia estarrecida com a situação, e profundamente humilhada, com a declaração de Diana ecoando em sua mente: “não significa nada”, levantou-se e caminhou em direção à porta depois de recolher sua bolsa.

-- Ei mocinha onde você pensa que vai? – A mulher furiosa perguntou.

                Natalia empalideceu, engoliu o pigarro e respondeu altiva:

-- Pra qualquer lugar longe dessa confusão que não significa nada para mim.

-- Você fica, quem vai pra longe dessa confusão sou eu, continuem a se esfregar aí, eu tenho mais o que fazer.

-- Júlia espera meu amor, não sai assim!

                Júlia não esperou, bateu a porta com força, deixando o apartamento de Diana. O clima que se instalou não podia ser mais estranho. Diana se jogou no sofá levando as mãos à cabeça, olhando para o teto, enquanto Natália se perguntava o que ainda fazia ali, na cabeça uma confusão de sentimentos e sensações, na garganta, desaforos e insultos presos, no olhar uma mágoa inédita, inenarrável.

                Abriu a porta, mas, antes de sair, Diana lhe interpelou:

-- Você vai embora?

-- O que você acha?

                Natalia fez menção de sair quando foi impedida mais uma vez por Diana.

-- Ei! Você não precisa ir embora, está louca? Já é madrugada!

-- Perigo maior estou correndo aqui, louca eu fui de confiar em você!

                Natalia saiu, mas, Diana lhe puxou o braço e trancou a porta.

-- Você não vai a lugar nenhum!

-- Quem você pensa que é pra mandar em mim? Afinal não significo nada pra você! Por que você significaria algo para mim?

                Diana baixou os olhos, fugiu da mágoa que jorrava pelos olhar e palavras de Natalia.

-- Eu não quis dizer aquilo, estava nervosa com a presença de Júlia, fiquei atordoada, não sabia o que estava falando. – Diana tentou se justificar.

-- Não queria dizer, mas disse! Quer saber Diana? Não quero olhar na sua cara nunca mais! Quero ficar longe de você! Não sei o que você tem com essa mulher, e nem quero saber! Agora abra essa porta!

-- Entendo que você me odeie e queira ficar longe de mim, mas, não coloque sua vida em risco por minha causa, espere amanhecer, durma no sofá, prometo que não vou te importunar.

                Natalia não respondeu, jogou a bolsa na poltrona, engoliu o choro, não permitiria que Diana visse uma lagrima no seu rosto. Em silêncio Diana deixou cobertor e travesseiro no sofá, enquanto Natalia mantinha seu olhar perdido na réstia de luz que entrava pela varanda.

                Naquele resto de noite, nem Natalia, nem Diana dormiram. Separadas fisicamente por paredes os pensamentos estavam ligados. Uma se martirizava por ter cedido a um desejo inconseqüente, errado, escuso, pecaminoso, quando refletia sua atitude de beijar uma mulher. Martirizava-se ainda mais, por sentir seu corpo queimar ressentindo as sensações daquele beijo, imaginando o que poderia ter acontecido se não fossem interrompidas. E quando pensava na interrupção, o martírio era ainda maior, as imagens se confundiam com o eco da discussão entre Júlia e Diana acentuando o turbilhão de sentimentos contraditórios que inundavam seu interior. A outra se punia pela dupla mágoa que causara, se punia por desejar tanto Natalia, por ter traído Júlia, mas principalmente sofria por saber que Natalia estava tão perto e naquele momento era intocável pra ela.

                Natalia testemunhou o sol nascer, como liberta de um castigo, saiu daquele apartamento disposta a nunca mais retornar.

                Diana amargou a certeza de que Natalia não lhe perdoaria tão fácil, quando percebeu que esta deixara o apartamento muito cedo, sem recados, sem despedidas. Amargou ainda a tarefa de procurar Júlia, e tentar sanar a situação caótica que se instalou no seu namoro com o flagrante da traição.

*******

                Julia não se moveu ao notar a chegada de Diana no seu estúdio. A mulher de seus 35 anos era uma escultora de renome internacional, mas pouco conhecida no Brasil. Mantinha uma relação com Diana há quase um ano e meio, fora responsável por apresentar a loirinha o mundo das artes, indicar cursos e profissionais do melhor gabarito para sua carreira como fotógrafa, além de abrir o olhar da jovem para a sensibilidade de fotos artísticas, em suma, deu ao talento de Diana o molde da arte, talvez por isso, a loirinha além de ter pela escultora uma admiração inabalável, tinha também uma gratidão imensurável.

                Já havia algum tempo que Diana não diferenciava o que sentia por Julia se amor ou uma grande amizade. Verdade seja dita, Julia lhe ensinara muito sobre tudo, sobre arte, história, música, e também sobre a relação entre mulheres, sexo, além de ser de longe a companhia mais agradável para qualquer programa.

-- Oi, precisamos conversar. – Diana falou mansa.

-- Fale em primeira pessoa Diana, você pode precisar conversar, eu não. – Júlia disse sem olhar para Diana.

-- Júlia, eu me sinto péssima pelo que fiz, não tinha o direito de te magoar assim...

-- Você quer que eu lhe conforte por se sentir mal com o que fez?

-- Não é isso Júlia! Eu quero que você me perdoe, foi um deslize, me deixei levar pelo clima, mas não teve importância, foi só um beijo...

-- Diana chega! – Julia se levantou e caminhou em direção a Diana. – Você sabe muito bem o que penso sobre relacionamentos, que não tolero deslealdade nem de amigo, que dirá de namorada. Se não teve importância pra você, isso é ainda pior! Por que você me traiu por algo sem importância.

-- Júlia eu juro foi só um beijo!

-- Diana para! Eu te conheço muito bem, só foram beijos por que cheguei antes que você comesse a menininha! Por que era isso que ia acontecer ontem!

-- Você me conhece, e acha que te trairia despudoradamente assim?

-- É por te conhecer que digo: o que vi ontem, não foi algo sem importância.

-- Como assim?

-- Diana, você sabe perfeitamente do que estou falando.

                Julia lavou as mãos e deu as costas a Diana, em uma atitude metafórica, a escultora encerrou a conversa que não queria ter, apelando para a inteligência e sensibilidade de Diana, fazendo-a entender que era o fim.

*******

                Natalia tentou enganar seus próprios pensamentos, tentando em vão achar uma explicação sensata que justificasse a inquietude do seu corpo, da sua mente, quando revivia involuntariamente os momentos que passara com Diana.

                Passou o dia inteiro para fazer um trabalho bobo de filosofia, a única linha que conseguia escrever, envolvia o conceito que Diana lhe dera, dezenas de folhas amassadas foram o saldo do dia, ao final, um amontoado de respostas sem sentido.

-- Pra filosofia deve servir.

                Pensou sozinha.

                Em lados opostos da cidade, Diana e Natália estavam juntas, se revirando na cama, atestando a insônia como companheira da noite. Natália não conseguia assimilar como sua paz fora abalada tão bruscamente, e o mais estranho de tudo, era que não sentia arrependimento. Era uma afronta á sua sensatez, precisava esquecer o que acontecera e principalmente, banir Diana da sua vida.

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