segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

LEIS DO DESTINO: 21º CAPÍTULO

CAPITULO 21: Bellum interius
*Batalha interior



                Uma semana se passou. Nesse período, Natalia conteve por diversas vezes o impulso de ligar para Diana a fim de saber notícias suas. A falta de informações sobre a saúde da mãe dela, e sobre a própria Diana deixou Natalia uma pilha de nervos naqueles dias. Não podia sondar notícias com Pedro ou Lucas, isso despertaria a curiosidade dos dois, mas, essa era sua única opção.

                Procurou pelos gêmeos na universidade, justamente quando precisava nem o acaso, nem sua busca foram seus aliados. Esperou até a sexta-feira, certamente encontraria os meninos no Botecão, arranjaria uma forma de obter alguma informação.

                Como esperava, a turma de amigos da república Álibi estava mesmo no bar. Logo, as meninas do time de vôlei acolheram animadas Natalia. Lucas e Pedro reticentes foram econômicos na simpatia e atenção corriqueiras com a moça.

                O comportamento dos gêmeos obrigou Natalia a tomar a iniciativa de se aproximar deles, fato que obviamente causou estranheza em ambos.

-- O que foi que deu em você hoje para aparecer por aqui? – Lucas perguntou.

-- Nada demais, só precisava me distrair um pouco.

-- E o namorado? Não se chateia com o fato de você sair assim? – Pedro indagou.

-- Pedro você acha mesmo que sou do tipo de mulher que homem manda?

                Lucas gargalhou, zombando da cara de Pedro ao receber a resposta insolente da moça. Constrangida, Natalia desconversou indo direto ao assunto que lhe levou até ali:

-- Como está a mãe da amiga de vocês?

-- Está falando da Diana? – Lucas interrogou.

-- Sim.

-- Ah, está melhor, saiu da UTI, mas, precisará de muitos cuidados, não pode sofrer grandes emoções, Diana nem voltou ainda, está lá cuidando dela. – Pedro respondeu.

                Aliviada pelo fato da mãe de Diana estar melhor, Natalia questionou finalmente a si mesma sobre tanto empenho para ter notícias de Diana e a preocupação com o bem-estar dela. A verdade é que ela sofria não só a falta de notícias ou a apreensão sobre a saúde da mãe de Diana, mas também sua ausência. Chegou a se condenar por não conseguir simplesmente ficar indiferente aos problemas de Diana.

                Com seu objetivo alcançado, Natalia concluiu que não tinha nada mais o que fazer ali. Enquanto seguia para o banheiro, foi abordada por Sandro, seu colega de sala, o típico filhinho de papai, com uma irreverência inconveniente. No episódio da foto do trote, ele chegou a discutir com Diana sobre a atitude da moça de recolher as fotos na sala.

-- Opa! Olha só quem resolveu se juntar aos bons hoje! Natalia, a gostosa da capa! Aquela sua foto deveria ser capa de revista sabia? Com menos roupa, quem sabe até a Playboy, já pensou?

-- Não enche Sandro! – Natalia empurrou o rapaz irritada.

-- Ei! Você é muito estressadinha, só fiz um elogio.

-- Dispenso seus elogios, me dá licença, preciso passar!

                Sandro cercava Natalia com insistência.

-- Pra que a pressa? Está fugindo de mim?

-- O que? Se toca garoto!

-- Sabe, eu conheço um remédio ótimo pra sua irritação...

                Sandro avançou no corpo de Natalia, lhe roubando um beijo. A moça esperneou, e sem defesas mordeu os lábios do rapaz, que se afastou bruscamente transtornado notando o sangue escorrer por sua boca.

-- Está louca sua vadia?!

-- Louco é você! Fique longe de mim!

-- Você vai se arrepender de me rejeitar assim! Você não sabe com quem se meteu.

-- Está me ameaçando? Não tenho medo de ameaças de covardes como você.

-- Vai acreditando nisso sua caipira ridícula... O que você faria se aquela foto caísse na internet?

-- Você está louco? Eu te processo!

-- Sabe que tem muitos recursos de edição que fácil consigo tirar até a pouca roupa que você usava na foto?

-- Eu te denuncio!

                Natalia estava completamente transtornada, tentava agredir fisicamente o rapaz. Sandro a segurou com violência e revelou:

-- Muito cuidado comigo, posso fazer da sua vida um inferno, do mesmo jeito que espalhei as fotos pela universidade, posso espalhar pelo mundo todo, basta um clique.

-- Então foi você?

                Natalia apertou os olhos, enquanto uma lágrima percorria sua face.

-- E não hesitaria em fazer de novo.

                Sandro empurrou Natalia, e se afastou limpando o sangue da boca.

                Natalia não sabia o que lhe doía mais, se a ameaça de Sandro e sua revelação ou o fato de atestar que Diana não mentira. Entrou no banheiro, e permaneceu por um longo tempo entregue a um pranto sentido, culpado, solitário.

                Demorou a se recompor, lavou o rosto e decidiu ir embora dali, em casa, ligaria para Diana, estava decidida a obter o perdão dela.

                Quando se despedia das colegas e dos gêmeos, ouviu a movimentação de outras pessoas da mesa, uma algazarra que atraiu os demais para a calçada. Natalia seguiu os e por pouco seu coração não saltou pela boca quando viu sair de um carro esporte importado a dona dos seus desejos: Diana.

-- Aeee Diana olha a responsa da caranga!

-- Arrasou menina!

                Eram os comentários dos colegas que recepcionaram Diana. Natalia pouco se importava com o luxo do carro que atraiu a atenção de todos, seus olhos tinham um só alvo: Diana. Ficou paralisada, observando cada movimento da loirinha que esbanjava a simpatia entre os amigos, não notando Natalia no meio deles.

-- De onde surgiu essa máquina Diana?

-- Ah... Exigência de minha mãe jogou baixo comigo, me obrigando a me desfazer da moto, por que isso a preocupava demais... Como ela não pode passar por contrariedades, aceitei minha cota de sacrifício.

                Diana falou em tom jocoso.

-- E você veio de Brasília com essa belezura? – Lucas perguntou acariciando o carro.

-- Imagina... Meu pai autorizou a compra em uma concessionária daqui, cheguei hoje de manhã e passei o dia resolvendo os detalhes da compra, documentação...

-- Precisamos estrear esse carro Di! – Uma das meninas mais afoitas berrou.

-- Quando você quiser gatinha!

                Com o intuito de ser vista, tomada de ciúme, Natalia pôs-se à frente dos que cercavam Diana, foi quando esta finalmente a viu. Durou apenas segundos a troca de olhares, o suficiente para Natalia ler algo que lhe doía muito reconhecer: a mágoa de Diana.

                Diana desviou o olhar e entrou no bar, Natalia baixou os olhos e seguiu também a turma, naquela situação desistira de ir embora, precisava falar com Diana, e seria naquela noite.

                Durante o resto da noite, Diana parecia fazer questão de ignorar Natalia, mas era puro fingimento, pois, a observava com o canto do olho, e se aproveitava da vigília da moça para provocar seus ciúmes, enrolando nos seus dedos o cabelo das meninas que se aproximavam, simulando um flerte.

                A saída de Natalia era beber. As rodadas de tequila se acumulavam alterando o estado normal da menina do interior.

-- Natalia sei que não tenho nada com sua vida, mas você passou mal da ultima vez que bebeu tanto, não acha que devia ir com calma? – Lucas foi cauteloso com as palavras.

-- Estou bem Lucas, obrigada por se preocupar.

                Preocupado com a moça, Lucas sentou ao seu lado, na tentativa de regular o instinto alcoólico de Natalia. A cada minuto que passava, mais aumentava a necessidade de Natalia falar com Diana, sua vontade era cometer uma loucura, e arrastá-la na frente de todos e lhe roubar um beijo, fantasiando que isso fosse o suficiente para selar a paz entre elas. Não podendo se render a tal vontade teve a brilhante ideia de enviar mensagem de texto para Diana.

-- “Preciso falar com você agora”.

                Diana leu a mensagem, mas não respondeu. Mentalmente estava decidida a não facilitar as coisas para Natalia. Estava ferida, por ela não ter confiado, por acreditar que Diana seria capaz de espalhar as tais fotos e principalmente, pela ausência de Natalia durante o período crítico que foi a doença da mãe. Nesses dias, recebera telefonemas de Lucas, Pedro, Julia e até de colegas da faculdade, mas, seu desejo era ouvir o consolo mesmo que à distância de Natalia.

                Ansiosa, Natalia encarava Diana cobrando uma resposta, mas a loirinha não estava nem um pouco disposta a dar o braço a torcer. Não respondeu à mensagem, nem muito menos deu importância aos sinais que Natalia dava.

                Aos poucos o bar se esvaziava, apenas os moradores da república, algumas meninas mais íntimas além de Diana e Natália, permaneciam ali na mesa antes lotada.

-- Natalia está ficando tarde, você quer que eu te acompanhe até o ponto de ônibus, ou chame um táxi? – Pedro perguntou preocupado.

-- Está me expulsando daqui Pedro? – Natalia falou com a voz lentificada.

-- Claro que não, nem o dono do bar sou para fazer isso, só me preocupo com sua segurança.

                Natalia fez uma expressão indiferente, com o olhar fixo em Diana, sem se preocupar mais em disfarçar sua atenção na loirinha.

-- E aí gente? Vamos esticar? Baladinha numa boate? – Diana convidou.

-- Eu topo! – Uma das meninas disse sorrindo para Diana.

-- Vai ficar pra outra vez Di, amanhã temos treino do time de basquete pros jogos universitários. – Lucas se justificou.

-- Então vamos só nós duas Mônica? – Diana sorriu para a garota.

                Natalia virou a tulipa de Chopp como se fosse um energético para dar a coragem de anunciar:

-- Eu também vou!

                A reação de todos na mesa foi de perplexidade. A moça comedida do interior, aceitar justamente um convite de Diana para uma balada, era no mínimo estranho, especialmente por que, não era segredo para os amigos da loirinha o tipo de ambiente que esta selecionava para suas conhecidas “esticadas”.

-- Natalia, não acho uma boa ideia... Você não vai gostar do lugar e você já bebeu demais... – Pedro praticamente cochichou para a moça.

-- Pedro, eu sei me cuidar, mas obrigada pela preocupação. Vamos meninas?

                Diana e Mônica entreolharam-se surpresas, quando Natalia se levantou da mesa convidando-as.

-- Vamos lá então caipira.

                Diana pegou as chaves do carro e foi seguida por Mônica e Natália, entraram no automóvel, onde contrariada, Natalia ficou no banco de trás, rumando para um destino desconhecido para ela.

*******

                Natalia praticamente fuzilava Mônica pelo olhar, vendo a moça se derreter para Diana que não impunha resistências a isso, interiormente se divertia observando a tromba de Natalia pelo retrovisor.

                Chegaram a uma boate no lado oposto da cidade. Diana parecia conhecer todos que esperavam na fila para entrar, mas, não se juntou aos conhecidos diante da entrada, seguiu para a esquina, onde a entrada dos fundos era guardada por dois seguranças.


                Bastou um sorriso e um cumprimento íntimo para os dois engravatados abrirem espaço para Diana e suas acompanhantes passarem.

-- Quando dizem que sobrenome abre portas, eu não sabia que era uma expressão tão literal! – Brincou Mônica.

-- Deixa de ser boba garota! Eu tenho passe livre, por que toco aqui!

                Diana caminhou direto para a área VIP da boate, no trajeto, parou inúmeras vezes, cumprimentando conhecidos e conhecidas, algumas demonstravam uma intimidade que não agradou nem um pouco Natalia.

                A menina do interior estava atordoada naquele ambiente. O jogo de luzes intermitentes e coloridas, as batidas da música alta, e aquela pequena multidão de gente alternativa eram novidades para Natalia. Como se não bastasse seu estado tocado pelo álcool, todo aquele alvoroço de acontecimentos à sua volta naquele cenário aumentou sua tontura. Nem conseguia enxergar as coisas com nitidez, mas era capaz de notar que a maioria dos casais que se agarravam na pista não eram convencionais: eram casais de homens, casais de mulheres, algo que de onde Natalia vinha, nunca veria.

                Na área VIP, um pouco mais afastadas da confusão de pessoas se esbarrando e dançando, as três se acomodaram perto do bar, se serviram das bebidas oferecidas gratuitamente aos convidados daquele setor. Mônica, a mais empolgada, insistia para Diana dançar com ela, entretanto, a loirinha agora parecia mais preocupada com Natalia, que estava visivelmente perdida naquele lugar.

-- Ah, você não vai? Então eu vou! – Mônica anunciou, pegando mais uma dose de bebida, descendo para a pista de dança em seguida.

                Não exatamente como queria, mas enfim, Natalia estava “a sós” com Diana.

-- Então você toca aqui? – Natalia se aproximou puxando assunto.

-- Ahan. – Diana não olhou para Natalia enquanto respondia indiferente.

-- Eu te mandei uma mensagem, não recebeu? – Natalia perguntou tímida.

-- Recebi. Mas, acho que sua mensagem chegou com uns dez dias de atraso.

-- Eu pensei em ligar quando soube da sua mãe, mas...

-- Olha só caipira, você deixou muito claro que não queria mais me ver, nem ao menos falar comigo, eu só te devo uma coisa, por uma questão de honra: provar que não fui eu que tirei aquelas fotos e as espalhei.

                Diana disse com um tom magoado e olhar frio.

-- Você não precisa provar nada. – Natalia falou com os olhos baixos.

                A loira franziu as sobrancelhas estranhando a fala da outra.

-- Impressão minha ou você está sabendo de alguma coisa que eu não estou sabendo?

-- Eu descobri quem fez isso.

-- Descobriu? Então por isso você está falando comigo não é? Que tonta que fui, pensei por um instante que você estivesse arrependida de ter duvidado de mim, que queria conversar comigo pra me pedir desculpas por ter me acusado, e por ter ficado ausente esses dias apavorantes pra mim...

-- Eu queria estar perto de você...

-- Natalia chega, não gaste seu latim comigo, não vai adiantar, nada do que você disser vai desfazer seu vacilo. Agora sou eu que digo: deixe-me em paz.

-- Diana espera...

                Natalia segurou o braço de Diana que ameaçou se afastar dela.

-- Estou aqui pra você... Por você.

                As palavras sinceras acompanhadas de um olhar suplicante de perdão quase amoleceu Diana, que encarou Natalia desarmada. Mas, aquele momento foi interrompido por uma mulher conhecida que se agarrou no pescoço de Diana, fazendo algazarra.

-- Di! Saudade! Onde você se escondeu?

-- Luciana tinha que ser você pra me assustar assim! – Diana brincou.

-- Ah você me conhece, tudo é festa pra mim.  E você... Eu te conheço... – Luciana apertou os olhos em direção à Natália. – Ah claro! Você estava com a Diana naquele dia que a esqueci presa no arquivo...

                Natalia balançou a cabeça confirmando.

-- Nossa você era a última pessoa que esperava encontrar aqui. – Luciana comentou divertida.

                Natalia ficou tímida, o álcool que ingerira parecia não provocar mais a desinibição que a moça objetivara ao fazer seu uso descontrolado. Por algum tempo permaneceu reclusa apenas escutando o papo animado entre Luciana e Diana, sofrendo a aparente indiferença da loirinha. Afastou-se sem alarde para o bar, pediu uma bebida, que mais serviu de distração para o passeio dos seus dedos nos cubos de gelo do que propriamente para beber, sentia-se nauseada, frustrada, dolorida pelo tratamento que recebera de Diana.

                Diana fingiu não se dar conta que Natalia se afastara, mas acompanhou a moça com os olhos, tal atitude não passou despercebida pela amiga:

-- Ok desembucha! O que está rolando entre você e essa menina?

-- O que? Rolando nada, ta doida Lu?

-- Não insulta minha inteligência, você sabe perfeitamente que meu jeito distraído é puro charme! Você pensa que eu não captei a energia?

-- Ai lá vem você com esse lance de energia... Acho que você tem que sintonizar melhor então seu para-raios!

-- Diana não enrola... Primeiro você e Julia rompem o namoro, depois você aparece no fórum pra fazer um trabalho de faculdade, fica horas trancada com essa menina lá, ela sai correndo e você nem explicações me dá pra sair correndo atrás dela, agora você reaparece nessa boate acompanhada dela, encontro o maior climão entre vocês, e agora você está aí, roendo as unhas louca pra olhar pro bar onde ela está só não fez isso ainda pra não reconhecer que estou certa!

                Diana revirou os olhos.

-- Não sei o que você usou naquele banheiro hoje, mas provavelmente estava estragado, você está surtando!

-- Ah então ta, estou enganada... Sendo assim, você não vai se importar se eu disser que a Isadora já está com a armadilha pronta para pegar girino...

                Diana se virou abruptamente e viu o que torcia ser apenas uma brincadeira de Luciana: Isadora, a “bar girl” da boate, famosa por promover o “test-drive” em muitas clientes dali.

-- Cara essa Isadora não tem jeito. Não ta vendo que é só uma menina que está perdida aqui? Vou lá.

-- Opa opa opa! Como assim uma menina perdida? Vai lá fazer o quê?

-- Luciana a garota veio comigo, é uma caipira, o máximo de luzes coloridas que ela viu até hoje foram de ambulâncias ou da polícia! Sei lá o que a Isadora vai servir pra seduzi-la!

-- Desde quando você virou Wendy, a irmã mais velha das garotas perdidas? Simplesmente não combina com você essa proteção com uma caipira, em outra situação você estaria dando corda pra Isadora catar a guria.

-- Não quero que essa novata saia espalhando pelo campus que virou sapa por minha causa, Lucas e Pedro me matariam, estão apaixonados por ela!

-- Só Lucas e Pedro?

-- Não começa Luciana!

-- Diana, você quer mesmo que eu acredite que você não prestou atenção nessa menina?

-- Ah, por que deveria?

-- Você já teve o olho mais clínico... Pode até ser meio mal arrumadinha meio jeca ainda, mas é linda! Se você não viu isso, a Isadora já viu, e olha que eu nunca soube de nenhuma que resistiu ao charme dos coquetéis dela...

                No balcão do bar, Isadora não economizou sedução para conquistar a simpatia de Natalia, que já se mostrava mais receptiva ao papo da bar girl.

-- Está perdida aqui?

-- Depende do que você considera uma pessoa perdida... – Natalia respondeu mirando o copo.

-- Uma pessoa no lugar errado, na hora errada, que se pergunta o que está fazendo nesse lugar, mas não sabe ao certo aonde quer ir. Acertei?

-- É, acho que você me definiu bem nesse momento.

-- Então nesse caso, tenho uma notícia boa para você - Isadora se aproximou cochichando - as pessoas perdidas que vem para o Armazém, sempre são encontradas.

                Natalia ruborizou, não pelo conteúdo da frase, mas pelo que a bar girl deixou evidente nas entrelinhas, com o tom de voz usado e o olhar libidinoso.

-- Não perde tempo em Isadora! – Diana chegou encostando-se no balcão.

-- Tempo foi feito pra ser gasto, não perdido. Como vai Diana?

-- Não tão bem quanto você, a menina aí é quarta ou quinta da noite?

-- Depende a que você está se referindo, se está falando se ela é quarta ou quinta cliente que sirvo bebida, a resposta é não, já servi dezenas de clientes essa noite.

-- Você ao menos perguntou se ela tem idade pra beber? Não está vendo que é só uma menina?


                Diana se esforçava para não demonstrar irritação, mas isso estava claro na troca de farpas com Isadora. Notando ser o centro da discussão, e vendo a oportunidade de despertar os ciúmes de Diana, Natália se intrometeu na conversa:

-- Não estou vendo nenhuma menina aqui, tenho idade e vontade própria para beber o que quiser.

-- Você já bebeu demais essa noite, não pense que vou levar você bêbada para casa, pra você vomitar meu carro todo!

                Foi o único argumento que Diana encontrou para justificar sua censura com Natalia.

-- Se é esse o problema, não se preocupe, não volto no seu carro.

-- Posso saber como você vai voltar? Você nem sabe em que parte da cidade está caipira!

-- A garota já disse pra você não se preocupar Diana, mas, se você fica mais tranquila, me responsabilizo a colocá-la em um táxi, meu turno acaba em uma hora.

                Isadora disse sarcástica. Diana bufou. Encarou Natalia fixamente, deixando transparecer sua insatisfação com aquilo, mas, a moça não se intimidou, afinal conseguiu o que queria: arrancar Diana da indiferença com a qual ela afastou-a naquela noite.

-- Pois muito bem, lavo minha mão com você caipira.

                Diana saiu a passos rápidos e firmes contrariada. Aquela frase parecia estar mais carregada de mensagens subentendidas do que simplesmente um aviso casual. Apesar de sentir-se incomodada com tal percepção, Natalia decidiu prosseguir com sua estratégia de provocar ciúmes em Diana, e Daniele por sua vez, estava convicta que ganhara a confiança da garota.

-- Não sabia que você estava com a Diana, fiz mal em me meter? Ela saiu fumaçando daqui...

-- Fica tranquila, eu só vim de carona com ela, estudamos na mesma faculdade.

-- É só isso mesmo? Ou ela é o motivo de você estar tão atenta ao fundo do copo desde que se sentou aí?

                Natalia sorriu tímida.

-- É só isso mesmo.

-- Então assim fico mais tranquila. Daqui a pouco te mostro como as pessoas “se encontram” no Armazém menina perdida.

                Sedutora como ela só, Isadora beijou o canto dos lábios de Natalia, que não teve outra reação que não fosse paralisar. Sem saber ao certo no que estava se metendo, temeu como aquela noite poderia terminar. Depois que a bar girl se afastou para servir outras clientes, começou a observá-la, seu corpo, suas tatuagens espalhadas estrategicamente nos pontos mais sensuais, seu corte cabelo assimétrico, sua desenvoltura com os copos, garrafas e coqueteleira, o conjunto de características que justificavam o ciúme de Diana e a fama da garota de sedutora.

                Por mais que tentasse, Diana não conseguia afastar o pensamento do bar onde Natalia estava. Uma ideia martelava todo tempo: o corpo de Natalia que ela tratava com tanto respeito e admiração, para Isadora ia ser só mais um na sua extensa lista de conquistas. Enquanto tentava se distrair na pista da dança com Luciana e Mônica, ignorou os possíveis olhares de cobiça os quais era alvo, o que ela desejava na verdade era arrancar Natalia dali, protegê-la daquele movimentado mundo de vaidades onde impera a busca do prazer pelo prazer, e pior, a exposição a perigos os quais Natalia não estava preparada para distinguir e enfrentar.

                Puxou Luciana da pista de dança e pediu:

-- Você tem que tirar a Natalia de lá, aquela caipira não sabe no que está se metendo!

-- Diana vá você mesma e faça o que tem que fazer! Você está louca por ela!

-- Não viaja Luciana! Você sabe perfeitamente o que a Isadora vai fazer quando sair do turno de trabalho dela, a Natalia nem sabe que isso existe! Não quero a culpa de saber que a menina foi drogada, sabe-se lá o que fará depois disso.

-- É... Se a Isadora der uma balinha azul pra caipira, ela não vai saber é o que a Isadora vai meter nela...

                Diana arregalou os olhos apavorada.

-- Luciana a gente tem que fazer alguma coisa!

-- A gente quem cara pálida? Você tem! Por que eu to me mandando, com a sua outra companhia, que, aliás, você já deveria ter nos apresentado há muito tempo!

                Diana resmungou xingamentos contra as amigas vendo-as deixarem a boate abraçadas. Deu-se conta que nem Natalia, nem Isadora estavam mais no bar, deduziu que o turno da bar girl se encerrara, e assim partiu desesperada em busca das duas, não precisou gastar muito tempo para avistá-las na pista de dança: agarradas, envolvidas. Isadora segurava a moça pela cintura por trás, esfregando seu corpo no dela para a fúria de Diana.

                A loirinha avançou na direção das duas, empurrando os demais na pista, ao se aproximar, Natalia foi puxada por Isadora para um corredor que dividia os ambientes da boate. Diana sabia o que a bar girl pretendia, ali era um dos lugares mais utilizados para amassos mais tórridos pelos casais, além de também ser o ambiente que dava alguma segurança para o uso discreto de extasy ou outras drogas orais.

                Diana acertou na mosca, flagrou Isadora empurrando delicadamente um comprimido na boca de Natalia que parecia alheia a tal perigo. Como uma super heroína dos filmes de ação, empurrou a bar girl com violência.

-- Cospe isso Natalia!

                Assustada, a moça pinçou o comprimido azul ainda na sua língua, e foi arrastada pela mão por Diana para fora da boate.

Nenhum comentário:

Postar um comentário