domingo, 12 de junho de 2011

1ª temporada- Porque sei que é amor: Capítulo 27: Consequências

Foi difícil deixar Suzana naquela noite, meu coração apertava pela ânsia de saber que estava de fato tudo bem com ela. Camila estava exausta, tratei de cuidar dela, ela merecia, mais uma vez salvara a vida de Suzana com seu brilhantismo. Em casa preparei- lhe um banho, escolhi um pijama leve para ela usar, enquanto ela tomava banho, avisei a Vitor, Lourdes e Helena sobre o sucesso da cirurgia de Suzana, falando com orgulho do feito de Camila.

Preparei- lhe um lanche, o que a comoveu, uma vez que minhas habilidades culinárias consistiam em ligar pra qualquer delivery... Levei na bandeja pro quarto: suco, biscoitos, um sanduíche de ricota. Comemos juntas na cama, sem qualquer pressão em dizer algo, não precisávamos de muitas palavras para demonstrar carinho, estava tudo no nosso olhar. Deitamos juntas vendo qualquer programa na TV e assim Camila adormeceu nos meus braços.

Na manha seguinte Camila não trabalhava, pediu folga para acertar detalhes de seu projeto da tese do PhD, deixei-a em casa com a promessa de almoçarmos juntas, depois ela iria avaliar Suzana, que deveria manter-se em coma induzido. No hospital o irmão e as amigas de Suzana já me aguardavam, providenciei para que um de cada vez entrasse na UTI para ver Suzana.

Suzana evoluiu bem, assim no dia seguinte, providenciamos o desmame do ventilador mecânico e diminuição dos sedativos. Em algumas horas ela despertava, a equipe intensivista avisou imediatamente a Camila que apressou-se em avaliar o quadro pós-operatório de Suzana.

Para nossa satisfação, ela respondeu a todos os reflexos, falava com alguma dificuldade, mas isso podia ser por conta da desorientação. Mantivemos Suzana na UTI, os exames laboratoriais apresentavam algumas alterações importantes, provavelmente por causa do Lupus, a debilidade do organismo por conta da cirurgia influenciou algumas taxas comprometendo especialmente os rins e fígado.

Sempre que podia a visitava na UTI, nas vezes que a encontrava desperta, incentivava Suzana a falar sempre perguntando sobre seu estado. Ela me respondia automaticamente, notava seu olhar triste, sem vida. Uma semana depois da cirurgia, depois de já estar sendo acompanhada por um reumatologista de renome especialista em Lupus, Suzana foi transferida para o quarto, e assim, não pude fugir de uma conversa com ela.

- Isabela, eu posso esperar alguma coisa de você?

- Suzana, você tem que se preocupar com sua saúde agora.

- Por favor, não desvie o assunto, eu continuo esperando uma razão pra seguir esse tratamento, que você sabe que não terminará nunca...

- Não vamos falar nisso agora, por favor.

Suzana em um ato quase que de desespero, arrancou do braço os acessos para medicação, levantou- se e segurou meu braço com força, tentei fugir de seus olhos mas eles me prenderam, sem mais demoras Suzana puxou meu pescoço e me beijou com toda paixão guardada por todo esse tempo.

Não tive outra opção que não fosse me render, sentia falta de sua boca, sentia falta do seu corpo, mas o beijo não me trazia as mesmas sensações que experimentava quando estávamos juntas. Existia desejo, mas não aquele sentimento de plenitude que me tomava quando estava nos braços de Camila. E o que mais temia não pude evitar, Camila entrou no quarto surpreendo- nos com nossas bocas coladas, nada falou, fechou a porta com a mesma mão que abrira, seu olhar imediatamente brilhou, meu coração apertou, feri alguém que nunca me deu outra coisa que não fosse amor.

- Isso não podia ter acontecido! –vociferei com a voz embargada.

- Isa eu não queria que ela tivesse visto isso e...

- Você não tinha esse direito, Suzana...

Saí pelos corredores em busca de Camila, com a alma aos pedaços por ter certeza do quanto ela estava magoada comigo, sentia um medo que me sufocava, não podia perder Camila. Não a encontrei, e meu desespero ia aumentando, dispensei as consultas da tarde por falta de condições em me concentrar em qualquer coisa. Camila desligou o celular, não estava em casa, nem na casa da família, em nenhuma parte do hospital. Eliza sua secretária procurava- a em toda parte também, desmarcou suas consultas e reuniões visivelmente preocupada com o sumiço de sua chefe.

Fui para casa, na esperança de encontrar Camila lá. Em pouco tempo ela chegou, olhos inchados, pela primeira vez em um ano e meio, não vi o brilho do verde de seus olhos, Camila parecia transtornada, olhou-me com mágoa profunda, retirou do bolso nosso anel, colocando sobre a mesa de jantar.

- Arrume suas coisas Isabela, você tem até amanhã pra deixar minha casa.

- Cami... Por favor não faz isso... – eu soluçava me atirando aos pés dela. - Perdoe-me, eu te amo, aquilo não significou nada.

- Isabela me poupe dessa cena.

- Cami...

- Tudo tem limite, você ultrapassou todos. Eu vi Isabela, não foi um beijo forçado.

- Mas...

Eu não tinha argumentos, Camila estava certa em tudo, como quase sempre. Sentei no sofá tentando me refazer, como doía ver o sofrimento dela, como doía minha culpa por perdê-la, cheguei a odiar Suzana por esse beijo, senti-me desnorteada, sem chão, fui despertada daquela inércia com o barulho de coisas quebrando, vindo do nosso quarto, agora quarto de Camila.

Abri a porta do quarto, Camila estava lançando tudo na parede, porta-retratos, jarros, quadros, parecia que o tsunami passara pelo quarto, os travesseiros estavam rasgados, cortinas no chão... Camila chorava descontroladamente sentada ao chão coberto por vidros.

- Cami meu amor...

- Isabela por favor, sai da minha frente, some daqui.

O olhar de decepção de Camila para mim, me rasgou por dentro. Saí dali me sentindo a última das pessoas, como pude magoar assim a mulher que eu amava? Não provoquei o beijo, mas também não tive coragem de rejeitá-lo, nem tampouco de tirar de vez as esperanças de Suzana. Não podia voltar para meu apartamento, Vitor estava lá, dirigi sem rumo, até chegar a porta do meu antigo prédio, subi para o apartamento de Bernardo e caí nos braços dele num choro incontido.

- Minha amiga o que houve?

Não conseguia falar, Bernardo foi andando abraçado comigo, sentou- me no sofá, trouxe-me um copo de água com açúcar, sentou em um puf à minha frente, esperando que eu tomasse fôlego, meu ar parecia travar, minhas palavras não faziam sentido, na minha cabeça a imagem de Camila chorando no meio de cenário de destruição que nosso quarto se transformou.

- Isa, eu estou aqui se você quiser falar, se não quiser, também estou aqui do seu lado tá?

Caí nos ombros de Bernardo como se quisesse simplesmente só desabar.

- Eu a perdi Bê...

- Ow minha linda... O que aconteceu?

- Perdi meu amor, Bê...

- Isa... O que houve minha amiga? Nunca te vi assim.

Fui contando tudo o que havia acontecido em meio a lágrimas, Bernardo pediu- me calma, e que desse um tempo para Camila se acalmar, e aí conversaríamos, acabei caindo no sono no colo de Bernardo exausta de chorar. No dia seguinte, acordei na cama dele, não me acordou, já passava das 8H, estava atrasada, mas Bernardo tratou de ligar pro hospital avisando que me atrasaria. Minha primeira preocupação era saber de Camila, tentei ligar, mas seu celular continuava na caixa postal, Bernardo confessou- me que falei o nome dela a noite toda, me angustiava, chegava a sentir fisicamente o aperto no peito lembrar o estado em que deixei Camila.

Não passei em casa, nem ao menos tomei o café que meu amigo me preparou, lavei o rosto, prendi meus cabelos, e segui para o hospital, precisava falar com Camila, deixar claro o que sentia por ela e que Suzana não significava tanto o quanto pensava para mim. Não a encontrei no seu consultório, encontrei Eliza no corredor e apressei- me em perguntar- lhe:

- Eliza, onde está Camila?

- Dra. Isabela, eu...

- O que Eliza? Eu preciso falar com ela, por favor não me esconda...

- Doutora, eu sinto muito, tenho ordens expressas dela de...

- Eliza, por favor, eu estou desesperada, me ajuda!

- Doutora, ela viajou cedo para São Paulo, para tentar adiantar na embaixada, o visto para a viagem aos Estados Unidos.

- Adiantar? Mas a entrevista foi marcada para o próximo mês só...

- Ela me pediu hoje bem cedo para passar para o Dr. Marcos, todas as suas consultas, e algumas cirurgias, ela pretende ir para Boston até o final do mês.

Não consegui evitar, as lágrimas pareciam brotar como uma fonte de água, encostei minha cabeça contra a porta, Eliza olhou- me com compaixão, segurou meu ombro e disse baixinho:

- Doutora Isabela, no fim tudo dá certo, se ainda não deu certo, é porque ainda não é o fim. Li isso em algum lugar, e acredito na verdade dessas palavras.

Meneei a cabeça esforçando- me para abraçar qualquer esperança que me aproximasse de Camila novamente. Saí andando cabisbaixa pelos corredores em direção ao meu consultório, encontrando Vitor que avançou para me abraçar como era de costume:

- Ei minha doutora linda, não dormiu? Estava de plantão?

- Oi Vitor, não estava de plantão, só não dormi bem, sua irmã está bem?

- Sim, meio calada, isso não é normal – sorriu.

- Ah, eu tenho que ir Vitor, desculpe-me.

- Não vai passar pelo quarto dela?

- Não posso, estou com a agenda cheia.

Despedi-me dele e fui andando com meus pensamentos perdidos, eu parecia andar no automático, era notório meu abatimento, não queria ver Suzana, não suportaria vê-la, sei que associaria imediatamente ao sofrimento que causei a Camila e consequentemente a mim. Atendi os pacientes marcados, e a cada intervalo, ligava para Camila, sem êxito nas minhas tentativas de falar com ela. Não almocei, na verdade não saí do consultório o dia todo, no final da tarde, Eliza foi ao meu encontro com uma informação:

- Doutora, ela está em casa, acabou de chegar.

Não esperei sequer Eliza concluir o pensamento, saltei da cadeira, procurando a minha bolsa, nem tirei o jaleco, corri para o estacionamento para seguir ao encontro de Camila em casa. Ela estava sentada no sofá, nosso anel ainda estava sobre a mesa, onde ela deixou na noite anterior. Olhou para mim, e baixou os olhos em seguida, caminhei devagar com as mãos no bolso da calça, ficando na frente dela, com os olhos marejados. Camila estava tão abatida quanto eu:

- Veio pegar suas coisas?

- Camila, eu preciso conversar com você.

- Você pode precisar falar, mas eu não preciso te escutar, não mais, não preciso mais atender suas necessidades Isabela, isso é função de Suzana agora.


- Não fala assim comigo meu amor, Suzana não tem função nenhuma na minha vida.

- Mas você tem na vida dela e ao que me parece, você está desempenhando com maestria.

- Camila, acredita em mim, eu te amo, realmente Suzana não me beijou a força, mas não senti nada no beijo, é com você que eu quero ficar.

- Isabela desde que essa mulher voltou pra sua vida, ela te cerca, ela te confunde, te sensibiliza, e você arrisca isso que a gente tinha Isa! Deixando- se envolver, ela não é uma qualquer, e você me obrigou a engolir isso esses meses Isa, compreendendo tudo... O beijo que vi foi só uma confirmação do estrago que a presença dela nos trouxe, nossa relação não resistiu a sua ex, como que a gente pode casar?

- Eu nunca tive tanta certeza de algo na minha vida como tenho de que quero passar o resto da minha vida com você Cami...

- Não Isa, você não tem...

Camila chorava com uma mágoa que corroia meu coração, parecia que eu esgotara todas as minhas chances com ela.

- Camila, me dá uma chance... Não desiste de mim...

Beijei nosso anel, segurei suas mãos e continuei falando:

- Isso é sagrado pra mim Cami, isso que nós temos é sagrado pra mim, não me deixa...

Camila estava frágil, queria abraçá-la e convencê-la da minha verdade, dormir junto dela e acordar desse pesadelo, mas ainda via uma magoa profunda no verde de seus olhos.

- Isabela, não consigo te olhar... Não consigo acreditar no que você me diz, parece que você quebrou algo dentro de mim, não sei como reconstruir.

- Deixa que eu tente... Me dá essa chance...

Nesse momento levantou-se do sofá, segurou sua nuca, caminhando até a mesa de jantar onde nosso anel ainda estava, segurou, fitou-o por alguns segundos, me deixando ansiosa a cerca de cada movimento que ela executava diante de mim.

Aqueles segundos pareciam uma eternidade, aproximei-me dela, segurei o anel e coloquei no seu dedo, beijando-o em sua mão.

- E’ aqui que ele deve ficar meu amor, eu quero que você seja a minha mulher, e eu a sua.

Camila derramou uma lágrima olhando para nossas mãos unidas, e abraçou-me depois de um longo suspiro, desabando em meus braços, me trazendo alento e paz de volta, era ali que eu tinha que estar, era ali o meu lugar, junto a Camila.

- Isa eu não vou agüentar outra decepção, eu quero ir embora com você daqui o mais rápido possível, não quero mais Suzana entre nós.

- Vamos quando você quiser, você conseguiu adiantar o visto?

- Ahhh Eliza!

- Ai desculpa amor não briga com ela não, praticamente coloquei um bisturi na jugular dela pra ela desembuchar...

Camila enxugou as lágrimas, sorriu, mas voltou a seriedade para me falar:

- Isabela não vai ser fácil você recuperar minha confiança, ainda estou muito magoada, não sei se posso te pedir isso, mas não quero que você tenha mais contato com Suzana, qualquer decisão médica que ela precise, serei eu a responsável, você trate de terminar seu projeto da tese do mestrado e adiantar seus pacientes...

- Isso quer dizer que nós vamos ainda esse ano para Boston? – disse-lhe já descendo minha mão por dentro de sua calça.

- Isso quer dizer, que a senhorita vai ter que ralar muito pra ter esse corpinho na sua cama de novo... Vai mergulhar nesses afazeres, porque sexo comigo agora só depois de casada Isabela Bitencourt! – deu-me um tapa na mão, forçando a retirada dela entre sua calcinha.

- Au Cami!

- Falando sério Isabela, preciso de um tempo, ainda me dói muito lembrar do que eu vi, do que senti... Eu te amo, tanto que nem te pediria nada em troca... Mas se eu posso esquecer meu passado pra viver um futuro e um presente com você, acho que você também pode fazer isso.

- Justa como sempre... Você só me pede o que pode me dar não é?

- Isso... Agora você... Trate de tomar um banho, você está fedendo! – Camila riu depois de fazer cara de nojo pra mim.

- Ai amor...

- Vai, corre pro banho criança – estapeou meu bumbum me empurrando para o quarto.

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